Passada a espera do dia 9 de março e a tensão da realização da prova, podemos agora discutir os fatos sem especulações. A prova objetiva(não esqueçam, não se chama mais TPS) teve alto grau de imprevisibilidade. A entrada de tês matérias e a manutenção do mesmo número de questões certamente aumentaria, como aumentou, o grau de dificuldade da prova. Esse aumento não se deve, exclusivamente, ao fato de que a prova teria mais disciplinas, mas principalmente porque um número reduzido de questões a respeito de um programa tão amplo contribui para que muitos tópicos importantes fiquem de fora da prova, talvez boa parte deles considerados "temas quentes" ou previsíveis.
Quanto às características gerais da prova, não me surpreenderam as "pegadinhas" e os "detalhezinhos". Como já havia dito aqui e como cosutmo dizer repetida e insistentemente aos meus alunos, a prova objetiva exige do candidato alto conhecimento factual, exige que o candidato decore cronologias e seja capaz de perceber o erro factual básico. Fica a pergunta: por que uma prova tão factual? A resposta não é difícil: porque os fatos são irrecorríveis. Mesmo questões interpretativas são baseadas em interpretações de obras e autores específicos da bibliografia. É preciso "decorar" ou autor certo, "decorar" cronologias e saber relacionar esses fatos de forma a compreender o padrão de enunciado da prova.
Algumas questões "surpreendentes" nada tiveram de surpresa. Nas provas de História do Brasil e de História Mundial, as questões a respeito do Padre Antônio Vieira e do Padre Antonil, por exemplo, são parte do programa de História do Brasil, no tópico "manifestações culturais", e são suficientemente abordadas por Antonio Candido, que continuou como parte da bibliografia de História do Brasil. As questões de "História da Arte", por sua vez, são parte do programa de História Mundial, no tópico "vida cultural", e são suficientemente abordadas por Eric Hobsbawn nas quatro Eras, que contam com capítulos muito bem elaborados a respeito da vida cultural até o fim do século XX.
A prova de Direito entrou em detalhes de casos específicos, o que realmente a dificultou. Infelizmente, não se pode afirmar que esses casos não fazem parte da bibliografia do CACD. Eles estão lá nas principais obras. Não estão no Manual do Rezek, por exemplo, mas a prova não está obrigada ase restringir a uma abordagem básica dos temas. Questões jurídicas dos processos de integração regional também fizeram parte da prova, algo já indicado pela ênfase dada pelos nossos professores no IRBr (que são parte da banca da terceira fase) quanto ao tema.
Política Internacional e Geografia não foram surpreendentes ou particularmente difíceis. Trata-se de disciplinas cujos programas se confundem e têm uma abragência significativa. É possível que nessas duas disciplinas qualquer assunto possa ser abordado. A grande dificuldade, com certeza, foi o reduzido número de questões. Os candidatos que se mantiveram estudando apenas "temas quentes", ou apostaram em temas previsíveis, certamente tiveram dificuldades na solução das questões. Eu já disse, e repito, que "tema quente" nao existe, a melhor coisa a fazer é procurar cobrir todo o programa, embora eu admita quem em PI e Geografia a tarefa é praticamente impossível.
A prova de Economia não foi particularmente imprevisível. Como eu já havia alertado por aqui, haveria questões que exigiriam o uso das fórmulas, questões basedas em análise de dados de tabelas e questões de História Econômica. A prova manteve o padrão da prova de economia da terceira fase em 2007: questões fáceis, questões de dificuldade média e questões difíceis. Acredito que os candidatos que estudaram Economia desde o princípio devem se beneficiar. Quanto ao grande número de questões de História Econômica do Brasil, bastava uma boa leitura e, evidentemente, um bom "decoreba" de A Ordem do Progresso, que está na bibliografia e responde a todas as questões desse tópico na prova.
A prova de Português manteve seu padrão. Embora tenha reduzido seu peso relativo, acredito que cartorze pontos em uma única prova são decisivos para a aprovação. Houve uma boa parte de interpretação de texto e manteve-se a tradicional abordagem gramatical do conhecimento antinatural do Português: regras de exceção, nomenclatura gramatical específica e ênfase em pontuação.
A prova de Inglês foi sigificativamente mais fácil. Não houve questões de "fill in the blanks" com preposições e "collocations". Candidatos com um bom nível de Inglês devem obter excelente resultado, o que não necessariamente acontecia quando a prova dava ênfase excessiva a questões gramaticais e pegadinhas quanto à regência e ao vocabulário. Foram nove preciosos pontos que devem fazer a diferença.
A prova não foi fácil. Beneficiou-se o candidato que se preocupou fazer uma preparação abrangente desde o início e que compreendeu a necessidade, já comprovada há alguns anos, de decorar dados e fatos. Não adianta mais apenas fazer leitura e compreender processos, é preciso decorar os fatos e as interpretações dos autores certos! Acredito que a nota de corte deva cair em relação a 2007, mas isso não é um vaticínio. Deixo aqui a minha aposta (que pode mudar quando saírem os primeiros rankings): o corte será na faixa do 44 pontos.
6 comentários:
Ótimo comentário! Gostaria de registrar a minha satisfação em encontrar um espaço com comentários de alto nível e relevantes, auxiliando todos aqueles que almejam seguir carreira diplomática. Sucesso para todos!
Leonardo Reis
Pelo fato da prova ter sido mais ampla, com matérias que não caíam desde 2004, acredito que os mais beneficiados serão aqueles que chegaram até a última fase no concurso de 2007 e não passaram por muito pouco. São possíveis candidatos que estão bem preparados e por isto devem ir bem na prova objetiva de ontem. Acredito que estas pessoas podem puxar a note de corte para cima. Por outro lado, a demanda pelo concurso diminuiu - muito pouco, mas toda redução é animadora - então isso também deve contribuir para a nota de corte cair. Por causa da prova ter abordado mais disciplinas e a concorrência ter sido suavemente reduzida, acredito que a nota de corte possa cair com relação a 2007, mas não muito. Afinal de contas, para quem veio se preparando há mais tempo, não acho que a prova possa ter sido muito difícil. Teve questões que se repetiram quase exatamente como em exames anteriores. A exemplo disto, posso citar uma que perguntava sobre a iniciativa do Mercosul que caiu em 2005 (ou 2006, não me lembro precisamente).
Caros Maurício e Fábio,
Não seria demasiado agradecer-lhes, ainda uma vez, por esta iniciativa. Animadoramente, as suas previsões quanto às tendências do CACD 2008 foram todas confirmadas: uma maior matematização da prova de Economia, a importância da obra "A Ordem do Progresso" para a parte histórica dessa disciplina, a exigência da base factual e cronológica para PI e HB, bem como a exploração dos temas à luz dos interesses brasileiros. Espero que ocorra realmente a redução da nota de corte como ora se está sugerindo, porque, embora eu tenha estudado sistematicamente e seguido os seus conselhos nos últimos meses que antecederam o concurso, achei o nível bastante elevado e não creio que alcançarei os 49 pontos do ano passado.
Gostaria, se possível, que vocês escrevessem em postagens ulteriores algo sobre a carreira de diplomata, o PROFA-I e o ambiente de trabalho.
Mais uma vez grato,
Frederico
Gostaria de compartilhar com Frederico o agradecimento à inicitiava de manutenção deste espaço. Quanto à prova objetiva, fiquei desapontado. Justifico.
A prova foi difícil não pela elaboração percuciente das questões, mas pelo conteudísmo de exceções e pelo apelo à memorização.
Não demonizo os fatos, mas não os considero irrecorríveis, posto que nã existem em estado bruto, mas apenas por intermédio da intervenção humana no tempo histórico (como a questão acerca do texto de Camara Cascudo exemplificou). Desde Kant, sabe-se que os sentidos humanos intermediam o conhecimento impedindo acesso ao mundo fenomenico puro. Da mesma forma desde o início do século XX, a crítica ao positivismo demonstra a interveniência humana na construção dos fatos (por meio de seleção, destruição, preservação, interpretação, ideologização...). Assim, com o Remond e outros historiadores franceses, creio que o fato deve ser considerado como ponto cristalizador dos processos. Nesse ponto, concentra-se minha decepção com a prova, a qual poderia ter relacionado fatos a processos de modo mais denso. Infelizmente, em muitas questões, percebi o fato pelo fato, o que, acredito, não se coadune com as exigências a que é submetido o profissional da diplomacia.
Por fim, gostaria de ver publicado especficamente algum texto sobre o PROFA neste espaço.
Grato,
Adelino.
Curiosidade: é a primeira vez que faço a prova e fiz porque queria conhecer o estilo. O que significa o corte, é o máximo, mínimo, média? Qual a pontuação necessária para aprovação? É a estabelecidade pelo corte?
44 ?? Será ??
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