Em um artigo passado, tratei da ascensão política e econômica da Índia, um dos candidatos a pólo de um eventual novo equilíbrio global de forças. Neste artigo, pretendo tratar de um outro candidato, mas com trajetória sensivelmente diferente daquela que marca a Índia: a Rússia.
A Rússia é, de fato, entre os Estados apontados como os futuros grandes do século XXI, o único que exerceu o papel de grande potência política e militar. De fato, pelo menos desde o início do século XIX, o Império Czarista já figurava entre as potências globais, tendo vencido, ao lado da Coligação, a França Napoleônica, e disputando com a Grã-Bretanha - a grande potência do período - a hegemonia sobre o Oriente Próximo e a Ásia Central. Declinou nas últimas décadas do século ao não conseguir acompanhar o ritmo da Revolução Industrial que se espalhava pela Europa e pela América do Norte e por se ver alijada da corrida imperialista pela África e pela Ásia. A ascensão dos Estados Unidos e do Japão contribuiu ainda mais para eclipsar a Rússia como grande potência no concerto internacional, especialmente após a derrota de São Petersburgo para as tropas japonesas na guerra de 1904-05, pela posse da Manchúria, derrota que engatilhou uma série de convulsões político-sociais que culminaria na Revolução de Outubro.
É a partir da constituição da União Soviética, em 1922, e do processo de estabilização do Estado e da sociedade após as convulsões da Revolução (ou revoluções, talvez seja mais exato) e da Guerra Civil - processo caro em termos políticos, econômicos e, especialmente, humanos - que a Rússia vai retomar sua projeção internacional. A era de Stálin e sua política marcadamente realista (realpolitik) e muito pouco - para dizer o mínimo - revolucionária ("socialismo num só país") deram ensejo à ascensão de uma potência política, econômica, militar e ideológica que foi capaz de fazer frente aos Estados Unidos. A historiografia mais recente tem questionado a dimensão do poder soviético e sua capacidade de equilibar o poderio americano, mesmo no período em que se deu o auge do Estado soviético, nos anos 60-70. Seja como for, o fato é que a URSS foi por aproximadamente quatro décadas uma das duas superpotências globais e atuou como bastião político e ideológico para "metade do planeta e quase um terço da humanidade", conforme nos recordam os sempre precisos dizeres de Hobsbawm.
O Estado soviético reinou soberano no concerto dual das superpotências até meados dos anos 80, quando sua crise já era evidente para o mundo todo. As profundas transformações por que passaram a Europa e o mundo nos anos 90 foram em grande parte causa e conseqüência da dissolução da URSS - a aceleração da globalização, a incontestabilidade do poderio militar e econômico americano da era Reagan, a falência do comunismo e a conseqüente 'primavera' dos povos do Leste Europeu, que se disseminou como parte de uma verdadeira revolução democrática global (a "terceira onda", nos dizeres de Huntington), que varreu o mundo da América Latina a Tiananmen.
A década de 90 foi caótica para a recém-reconstruída Rússia. Herdeira da URSS em vários aspectos, políticos e jurídicos principalmente, a Rússia não conseguiu manter o poderio de sua antecessora, que, na realidade, esfacelara-se antes mesmo do colapso do Estado, em 1991. Esforçando-se por ser aceita na comunidade internacional, Moscou não poupou esforços para normalizar suas relações com os Estados Unidos e com a Europa: liberalizou sua economia, numa clara aceitação dos princípios homogeneizantes do Consenso de Washington; negociou com Bielorússia e Ucrânia a transferência dos arsenais nucleares sob a posse destes países para a Rússia; endossou a Carta de Paris da OSCE, que por sua vez reafirmava os princípios da Ata de Helsinque de 1975, bem como dos direitos humanos, da democracia e da liberdade; aceitou o Acordo 4+2, que previa a reunificação da Alemanha; retirou tropas do Leste Europeu; assinou acordo de parceria com a OTAN; havia, ainda como URSS, apoiado a operação de paz contra o Iraque na Guerra do Golfo - medidas, enfim, que, entre outras tantas, tinham como objetivo o reposicionamento da Rússia na cena internacional. Os esforços, no entanto, não foram suficientes para (re)colocar o país nos trilhos: a Rússia seria sacudida por uma série de crises econômicas, que inevitavelmente respingavam para o mundo político, interno e externo. A partir de 1998, o país mergulhou numa crise finaceira que agitou os mercados de todo o mundo, um processo que foi a culminância da crise de transição pela qual passava o país. Não era fácil, afinal, desmantelar em poucos anos um sistema que por oito décadas fora controlado pelo Estado e passar o bastão para o indivíduo, o homos economicus, base de uma economia livre de mercado. Adicionalmente, no campo político a Rússia vivia as crises intermináveis do separatismo, especialmente na Chechênia, ocupada por tropas de Moscou desde 1994.
A Rússia de Ieltsin (1991-9), enfim, sacudida por crises internas, não conseguiu retomar o status internacional de que gozara a URSS por quase meio século. Numa análise retrospectiva, o caos da década de 90 parece ter começado a ceder a partir de 2000 - mais especificamente a partir de 31 de dezembro de 1999, quando Ieltsin renunciou à presidência do país em favor de seu ministro Vladimir Putin, que, presidente interino inicialmente, seria eleito para ocupar o assento presidencial no Kremlin em março de 2000.
A Rússia de Putin alcançou uma estabilidade política e econômica notável. Vários fatores contribuíram para o sucesso russo, alguns dos quais já destaquei em outro artigo ("2007 - uma retrospectiva", publicado em dezembro do ano passado): o crescimento econômico mundial acelerado; o ressurgimento do estatismo na economia do país, que foi capaz de conferir certa ordem ao caos econômico russo; a "caça aos oligopólios" promovida por Moscou; a quase ausência de oposição política organizada ao governo de Putin; a postura assertiva de Moscou na política internacional; o aumento do preço do gás e do petróleo - riquezas fundamentais para a economia russa -, entre outros fatores. O país voltou a crescer a taxas de 6-7% ao ano, e alcançou níveis de prosperidade inéditos para grande parte da população russa - alijada do livre consumo durante o período comunista e as crises dos anos 90. A estabilidade política foi alcançada- ainda que às expensas da democracia russa. Pode-se intuir, também, que o sucesso da economia russa contribua para eclipsar as demandas por mais abertura política. A Rússia é, seja como for, um país em franco crescimento econômico e politicamente estabilizado.
É aproveitando-se desse bom momento que a Rússia tem exibido um perfil extremamente assertivo nas mais variadas questões de política internacional. A recalcitrância dos anos 90 deu lugar a uma postura independente e afirmativa, que busca reinserir a Rússia no concerto das grandes potências.
Capacidade para tal, é inegável que a Rússia a tem. Economicamente, o país é o segundo maior exportador mundial de petróleo, e dispõe das maiores reservas de gás natural do planeta. Para além da riqueza que geram, nestes tempos de preços ascendentes de um e outro recurso, a Rússia os tem usado como instrumentos de poder estratégico para exercer pressão sobre a Europa. O continente é grande consumidor de hidrocarbonetos da Rússia, e todos os gasodutos e oleodutos que ligam-no ao Oriente Médio passam igualmente por território russo, o que dá a Moscou uma capacidade de controle e pressão notável, que já exerceu sobre os países europeus há alguns meses, quando ameaçou diminuir ou cessar o fornecimento de gás natural a pretexto de questões que envolviam a União Européia e países do Leste, ex-satélites soviéticos. Com um PIB de quase US$ 1 trilhão e crescimento anual nas casa dos 7%, capacidade científico-tecnológica desenvolvida, população alfabetizada, consumo interno em alta e exportações estratégicas, a Rússia conta com assets que fazem dela uma promessa econômica para o século XXI.
Política e diplomaticamente, a Rússia é membro permanente do Conselho Segurança e, desde 1997, o oitavo membro do G8. Tem a capacidade, portanto, de exercer grande influência sobre a construção da agenda internacional de segurança e, mesmo, de outros assuntos com os quais tem lidado o G8, inclusive meio ambiente. O país é partícipe ativo de todas as questões internacionais de peso - participa das negociações hexapartites com a Coréia do Norte e das negociações sobre a questão nuclear iraniana, apóia - por razões internas - os Estados Unidos em sua "guerra ao terror", foi decisivo para a entrada em vigor do Protocolo de Kyoto. Exerce ainda grande influência sobre a Ásia Central e sobre o Leste Europeu, o que tem levado o país a entrar em conflito com a União Européia e com os Estados Unidos - veja-se, por exemplo, a rejeição ao sistema antimíssil americano na Polônia e na República Tcheca ou - questão de extrema relevância no momento - o dissabor (para dizer o mínimo) com a iminência da independência de Kosovo.
Não apenas por questões externas, mas também por internas, a Rússia se tem mostrado contrária à independência da província sérvia. Externamente, Moscou teme pela perda de influência numa região historicamente estratégica, os Bálcãs, e pelo enfraquecimento ainda maior de seu antigo aliado, a Sérvia. Internamente, Moscou também teme que a independência kosovar sirva como exemplo a províncias e regiões habitadas por grupos étnicos distintos do grupo "hegemônico" - se se pode dizer assim -, o que, para um país multiétnico como a Rússia, pode significar a eclosão de uma série de movimentos separatistas do Báltico à Sibéria.
Militarmente, enfim, a Rússia conta com o disciplinadíssimo Exército da Federação Russa, criado em 1991 com o desmantelamento do Exército Vermelho, e com um setor industrial-militar que se situa entre os mais desenvolvidos do mundo. É, ademais - e mais importante - a segunda potência nuclear do planeta, com mais de 8.000 ogivas nucleares ativas e outras 12.000 "em estoque" (dados do SIPRI, Stockholm International Peace Research Institute, 2006; http://www.sipri.org/contents/expcon/Russia.pdf). Não há dúvida de que entre todos os "emergentes", a Rússia é o país militarmente mais bem-preparado e poderoso.
Hedley Bull, eminente autor da chamada Escola Inglesa das Relações Internacionais, afirma que toda potência emergente é, em sua região, já uma grande potência, e a Rússia não parece ser exceção. Ocorre, no entanto, que a Rússia e seu entorno configuram uma região historicamente disputadíssima - a "ilha mundial" e, mais especificamente, a heartland, na terminologia de Halford Mackinder. Isso significa que o ressurgimento da Rússia como grande potência global poderá causar mais atritos e conflitos do que se imagina, não apenas com a superpotência do momento, mas também com os países europeus e com as outras potências emergentes da região, especialmente a China. Como toda situação de estabelecimento de um novo equilíbrio, a emergência de novas potências poderá causar momentos de instabilidade e uma transição conturbada. A se fiar na História, pode-se apostar (na falta de um verbo mais apropriado...) que a Rússia estará no centro dos acontecimentos...
quinta-feira, 31 de janeiro de 2008
sábado, 26 de janeiro de 2008
COMENTÁRIOS SOBRE AS MUDANÇAS NA BIBLIOGRAFIA DO CACD
A bibliografia do CACD renovou-se. A despeito de polêmicas infundadas a respeito da ideologização da bibliografia, as mudanças indicam um novo perfil para algumas disciplinas e, em casos específicos, apenas mudanças que contribuem para agregar novos elementos à orientação e à preparação de um bom futuro diplomata. Vamos aos comentários, disciplina por disciplina:
PORTUGUÊS
A saída de Papéis Avulsos não é nenhuma indicação relativa à diminuição de importância da obra de Machado de Assis para a prova. Machado tem sido presença constante nas provas e acredito que assim permanecerá. Papéis Avulsos constou da redação e de uma questão de interpretação em 2007. Para 2008, é melhor estar preparado quanto a Brás Cubas. O romance tem muito elementos interessantes para a prova e, além disso, é uma excelente leitura.
A saída de Formação da Literatura Brasileira: momentos decisivos, de Antonio Candido, também não é nenhuma indicação em relação à diminuição da importância da obra para o CACD.
Tanto em 2006 quanto em 2007, Antonio Candido foi cobrado nas questões de interpretação. Também é importante lembrar que a obra permanece na bibliografia de História e que "manifestações culturais" são parte do programa dessa disciplina (em 2006 a prova de História da terceira fase teve uma questão sobre a Semana de Arte Moderna). Eu ficaria muito atento ao tema...
A saída de Raízes do Brasil me pareceu a mais interessante. Evidentemente, não acho que a obra seja ruim, mas acredito que Sérgio Buarque seja um dos autores mais presentes nos últimos anos. O conceito de "homem cordial" já está devidamente "orelhado", "mutilado" e mal usado depois de tantos resumos, fichamentos e palestras que se fizeram sobre o assunto para o concurso. A substituição por Visão do Paraíso dá a oportunidade de os candidatos conhecerem (já que a maioria não vai ler) outros aspectos e outros conceitos da obra de Sérgio Buarque. De todas as mudanças- em todas as disciplinas -, esta me parece ser a mais significativa: não foi feita "só pra constar". Se eu tivesse que escolher apenas um livro pra ler para a prova, seria Visão do Paraíso. Fiquem atentos...
As entradas de São Bernardo, em substituição a Memórias do Cárcere, e de Claro Enigma, de Carlos Drumond de Andrade, indicam uma tendência aos temas literários, ou ao tratamento de temas baseados em abordagens literárias. São excelentes obras que, acima de tudo, transformam o estudo em prazer.
Não esqueçam, todos os livros serão resenhados aqui no blog.
HISTÓRIA DO BRASIL
As mudanças na bibliografia de História do Brasil me parecem resultado de um processo de atualização dos estudos na área. Algumas obras menos atuais foram retiradas, algumas outras em função da falta de relevância no tema ou, até mesmo, por redundância. Incomodou-me, particularmente, a retirada da obra de Manoel Bonfim, uma das mais importantes originais obras que o pensam o Brasil. A retirada de tal obra, no entanto, não a invalida como importante contribuição ao pensamento crítico sobre o país. Outras duas saídas a lamentar são A Formação das Almas, de José Murilo de Carvalho- uma das obras mais interessantes que estudei -e A Idade de Ouro do Brasil, de Charles Boxer, uma obra de referência sobre a Colônia, a única que li entre dezenas de obras históricas que se aprofunda em eventos como a "Guerra dos Mascates" e a Guerra dos Emboabas.
A entrada de História Geral do Brasil, organizado por Maria Yeda Linhares, apenas legitima a imprescindibilidade dessa obra para o estudo do Império, principalmente. A entrada de Cronologia das Relações Internacionais do Brasil, do nosso professor no IRBr Eugênio Vargas Garcia, contribui para uma atualização dos pontos de vista acerca do tema.
HISTÓRIA MUNDIAL
Esta disciplina teve um número significativo de mudanças na bibliografia. A maioria delas parece ser atualização dos temas e inclusão publicações de ponta com novas abordagens sobre temas contemporâneos. Algumas mudanças foram apenas substituições de edições antigas por novas edições do mesmo autor. A base, entretanto, permanece: Sombra Saraiva e Eric Hobsbawn, os mais importantes para a prova objetiva. A entrada de Burns se fazia necessária há muito tempo.
POLÍTICA INTERNACIONAL
Esta disciplina também teve muitas mudanças na bibliografia. Claramente, na minha opinião, foi feita uma separação mais clara entre os temas de História do Brasil e de Política Internacional ao se retirar algumas obras que faziam parte da bibliografia das duas disciplinas. Muitas obras foram retiradas em virtude de sua desatualização ou superficialidade e substituídas por obras mais atuais e mais completas. Há também uma indicação de que Teoria das Relações Internacionais deve aumentar sua importância.
Entre as obras que entraram na bibliografia, destaque para The Globalization of World Politics, de Baylis & Smith, e de A Política Externa do Regime Militar Brasileiro, que já faziam parte da lista de livros que indiquei aqui no blog nos últimos meses. Ambos os livros são excelentes e abordam completamente os tópicos do programa com os quais se relacionam.
DIREITO
Apenas a entrada de uma obra do nosso professor Cançado Trindade, o que não é nenhuma surpresa e não indica mudanças de rumo.
ECONOMIA
As mudanças na prova de economia corroboram a tendência à matematização da prova. Acredito que esta será a prova mais difícil em todas as etapas e deve ser estudada com muita atenção. Mais do que conhecer os conceitos, é necessário que os candidatos tenham capacidade de analisar, calcular e representar matematicamente os conceitos econômicos. Eu recomendo uma boa revisão do programa e, se possível, aulas com um bom professor particular. Eu, por exemplo, não precisei estudar o que são isoquantas( e até hoje não sei o que são), mas está no programa de 2008... é melhor não vacilar!
Espero ter contribuído para a preparação de vocês, bons estudos e prossigamos os debates.
PORTUGUÊS
A saída de Papéis Avulsos não é nenhuma indicação relativa à diminuição de importância da obra de Machado de Assis para a prova. Machado tem sido presença constante nas provas e acredito que assim permanecerá. Papéis Avulsos constou da redação e de uma questão de interpretação em 2007. Para 2008, é melhor estar preparado quanto a Brás Cubas. O romance tem muito elementos interessantes para a prova e, além disso, é uma excelente leitura.
A saída de Formação da Literatura Brasileira: momentos decisivos, de Antonio Candido, também não é nenhuma indicação em relação à diminuição da importância da obra para o CACD.
Tanto em 2006 quanto em 2007, Antonio Candido foi cobrado nas questões de interpretação. Também é importante lembrar que a obra permanece na bibliografia de História e que "manifestações culturais" são parte do programa dessa disciplina (em 2006 a prova de História da terceira fase teve uma questão sobre a Semana de Arte Moderna). Eu ficaria muito atento ao tema...
A saída de Raízes do Brasil me pareceu a mais interessante. Evidentemente, não acho que a obra seja ruim, mas acredito que Sérgio Buarque seja um dos autores mais presentes nos últimos anos. O conceito de "homem cordial" já está devidamente "orelhado", "mutilado" e mal usado depois de tantos resumos, fichamentos e palestras que se fizeram sobre o assunto para o concurso. A substituição por Visão do Paraíso dá a oportunidade de os candidatos conhecerem (já que a maioria não vai ler) outros aspectos e outros conceitos da obra de Sérgio Buarque. De todas as mudanças- em todas as disciplinas -, esta me parece ser a mais significativa: não foi feita "só pra constar". Se eu tivesse que escolher apenas um livro pra ler para a prova, seria Visão do Paraíso. Fiquem atentos...
As entradas de São Bernardo, em substituição a Memórias do Cárcere, e de Claro Enigma, de Carlos Drumond de Andrade, indicam uma tendência aos temas literários, ou ao tratamento de temas baseados em abordagens literárias. São excelentes obras que, acima de tudo, transformam o estudo em prazer.
Não esqueçam, todos os livros serão resenhados aqui no blog.
HISTÓRIA DO BRASIL
As mudanças na bibliografia de História do Brasil me parecem resultado de um processo de atualização dos estudos na área. Algumas obras menos atuais foram retiradas, algumas outras em função da falta de relevância no tema ou, até mesmo, por redundância. Incomodou-me, particularmente, a retirada da obra de Manoel Bonfim, uma das mais importantes originais obras que o pensam o Brasil. A retirada de tal obra, no entanto, não a invalida como importante contribuição ao pensamento crítico sobre o país. Outras duas saídas a lamentar são A Formação das Almas, de José Murilo de Carvalho- uma das obras mais interessantes que estudei -e A Idade de Ouro do Brasil, de Charles Boxer, uma obra de referência sobre a Colônia, a única que li entre dezenas de obras históricas que se aprofunda em eventos como a "Guerra dos Mascates" e a Guerra dos Emboabas.
A entrada de História Geral do Brasil, organizado por Maria Yeda Linhares, apenas legitima a imprescindibilidade dessa obra para o estudo do Império, principalmente. A entrada de Cronologia das Relações Internacionais do Brasil, do nosso professor no IRBr Eugênio Vargas Garcia, contribui para uma atualização dos pontos de vista acerca do tema.
HISTÓRIA MUNDIAL
Esta disciplina teve um número significativo de mudanças na bibliografia. A maioria delas parece ser atualização dos temas e inclusão publicações de ponta com novas abordagens sobre temas contemporâneos. Algumas mudanças foram apenas substituições de edições antigas por novas edições do mesmo autor. A base, entretanto, permanece: Sombra Saraiva e Eric Hobsbawn, os mais importantes para a prova objetiva. A entrada de Burns se fazia necessária há muito tempo.
POLÍTICA INTERNACIONAL
Esta disciplina também teve muitas mudanças na bibliografia. Claramente, na minha opinião, foi feita uma separação mais clara entre os temas de História do Brasil e de Política Internacional ao se retirar algumas obras que faziam parte da bibliografia das duas disciplinas. Muitas obras foram retiradas em virtude de sua desatualização ou superficialidade e substituídas por obras mais atuais e mais completas. Há também uma indicação de que Teoria das Relações Internacionais deve aumentar sua importância.
Entre as obras que entraram na bibliografia, destaque para The Globalization of World Politics, de Baylis & Smith, e de A Política Externa do Regime Militar Brasileiro, que já faziam parte da lista de livros que indiquei aqui no blog nos últimos meses. Ambos os livros são excelentes e abordam completamente os tópicos do programa com os quais se relacionam.
DIREITO
Apenas a entrada de uma obra do nosso professor Cançado Trindade, o que não é nenhuma surpresa e não indica mudanças de rumo.
ECONOMIA
As mudanças na prova de economia corroboram a tendência à matematização da prova. Acredito que esta será a prova mais difícil em todas as etapas e deve ser estudada com muita atenção. Mais do que conhecer os conceitos, é necessário que os candidatos tenham capacidade de analisar, calcular e representar matematicamente os conceitos econômicos. Eu recomendo uma boa revisão do programa e, se possível, aulas com um bom professor particular. Eu, por exemplo, não precisei estudar o que são isoquantas( e até hoje não sei o que são), mas está no programa de 2008... é melhor não vacilar!
Espero ter contribuído para a preparação de vocês, bons estudos e prossigamos os debates.
sexta-feira, 25 de janeiro de 2008
A ascensão da Índia
Quando analistas fazem suas projeções sobre o futuro da economia e da política internacionais, costumam apontar para um conjunto de países que serão, a seu entender, as grandes estrelas do século XXI. Já se tornou famoso o acrônimo BRIC, criado pelo banco de investimentos Goldman & Sachs, composto a partir da primeira letra do nome de cada um dos quatro países que serão as 'vedetes' do capitalismo global das próximas décadas - Brasil, Índia, Rússia e China. De fato, um dos acontecimentos mais importantes neste início de século é a lenta, mas constante, alteração no equilíbrio econômico e político internacional. Se é verdade que os Estados Unidos, a Europa e o Japão continuam sendo o "centro", a "periferia" global tem-se tornado cada vez mais forte e presente na cena internacional, e é a grande responsável pela manutenção do dinamismo da economia global nos últimos anos. Enquanto os Três Grandes se arrastam, por assim dizer, com crescimento econômico baixo, na casa dos 2-3% em média (para não mencionar o Japão, que só há pouco se recuperou de uma recessão que se estendeu ao longo de quase toda a década de 90), China, Índia, Brasil e Rússia apresentam altas taxas de crescimento, da ordem de mais de 5% ao ano - registrem-se os espetaculares 11,2% de crescimento do PIB chinês, que pelo quinto ano consecutivo cresce a taxas de dois dígitos.
É interessante notar a atual "crise" (se é que temos uma - tenho pouco conhecimento em economia para arriscar qualquer prognóstico...) que abala os centros financeiros do planeta. Fosse há dez ou quinze anos, as economias em desenvolvimento estariam sendo varridas por uma onda de pessimismo que apresentaria todos os sintomas que são bem conhecidos por todos nós: queda brutal nas bolsas de valores, fuga de capitais, aumento da taxa de câmbio, inflação, queda nas exportações, instabilidade política... Contraste-se esse cenário com o atual: não apenas as economias em desenvolvimento continuam estáveis, mas também são chamadas a desempenhar o papel que outrora fora das economias desenvolvidas, isto é, sustentar o crescimento econômico global para deter a crise. Talvez possa haver um pouco de exagero nesse diagnóstico; mas quem duvida seriamente de que a China, consumidora voraz de produtos primários, a Rússia, grande exportadora de petróleo e gás, a Índia, mercado promissor para o desenvolvimento do setor terciário, especialmente TI, e o Brasil, o grande celeiro do mundo e um dos maiores mercados consumidores do planeta (não apenas em termos de população, mas também de renda per capita de seus cidadãos, quesito em que levamos grande vantagem sobre China e Índia) têm, sim, capacidade para impulsionar uma economia global claudicante?
Das quatro estrelas do futuro mundial, a China parece ser aquela destinada a desempenhar o papel mais importante. Não há analista (bom ou ruim) que não recorra a ela para explicar o mundo daqui a algumas décadas. Talvez por isso, o "BRI" de BRIC acabe sendo relativamente esquecido. Razão maior para esquecimento ocorre no caso da Índia, ofuscada pelo estonteante crescimento chinês justamente por se localizar nas vizinhanças do Império do Meio. Ademais, se Brasil e Rússia contam com um nível de desenvolvimento relativamente - sublinhese-se, relativamente - elevado, a Índia ainda luta para combater o grande flagelo da pobreza: numa economia menor do que a brasileira (US$ 1.1 trilhão contra US$ 906.5 bilhões - dados do FMI), aproximadamente 25% das pessoas estão abaixo da linha de pobreza, o que significa um contingente de mais de 250 milhões de indivíduos, quase 1,5 vez o tamanho da população brasileira, e auferem uma renda per capita de aproximadamente 700 dólares por ano (dados do Banco Mundial). Mas a Índia não é digna de esquecimento...
O que dizer do futuro papel de um país que, em menos de dez dias, recebeu a visita de líderes de duas das mais importantes potências mundiais, Gordon Brown (Reino Unido) e Nicolas Sarkozy (França)? Sem mencionar que uma semana antes, o premiê indiano Manmohan Singh havia sido recebido por Hu Jintao em Pequim. China, Reino Unido e França reafirmaram seus laços de amizade com a Índia, e foram além: a China prometeu manter os exercícios militares conjuntos que ambos os países têm realizado e promover, em 2008, o segundo Diálogo de Defensa China-Índia, além de ter expressado seu apoio às "aspirações da Índia de desempenhar um papel mais importante no âmbito das Nações Unidas, inclusive no Conselho de Segurança" (Joint Statement, 15 de janeiro de 2008. Fonte: PakTribune, http://www.paktribune.com/news/index.shtml?196221); já o Reino Unido e a França reafirmaram seu apoio à entrada da Índia como membro permanente no Conselho de Segurança - apoio que se estende ao G-4 - e se mostraram interssados em aprofundar seus laços econômicos com o país - inclusive na área militar (a França é a segunda maior fornecedora de armamentos para a Índia, atrás de Israel). O que dizer de um país que, a despeito de não ser signatário do TNP, teve seu programa e arsenal nucleares amplamente reconhecidos pela comunidade internacional, inclusive pelos Estados Unidos, com quem Nova Délhi assinou, em 2007, um pacto de cooperação nuclear para fins civis, à espera de aprovação pelo Senado americano? O que dizer de um país que mantém papel ativo, juntamente com o Brasil, nos principais grupos políticos que defendem a reforma de determinadas regras e estruturas do sistema internacional, como o G-4 e o G-20, além de atuar, juntamente com outras duas grandes democracias do mundo em desenvolvimento, no IBAS? Pode-se esperar que este país, a Índia, venha a desempenhar de fato um papel político e econômico muito mais importante do que alguns analistas prevêem (previsões, sempre elas...) para um futuro próximo.
Apesar de conhecer pouco sobre a política externa indiana, parece-me que a Índia tem rompido com alguns paradigmas que até há pouco tempo norteavam sua ação internacional. Outrora um dos grandes líderes do mundo não-alinhado, a Índia na atualidade se pauta por uma ação que visa à universalização de suas relações exteriores, principalmente em direção ao mundo desenvolvido, de quem esteve afastada pelo seu não-alinhamento ativista no MNA e no G-77 e pelo apoio que recebera da União Soviética nos tempos da Guerra Fria, especialmente a partir do cisma sino-soviético nos anos 60, da guerra sino-indiana de 1962 e da política de aproximação dos Estados Unidos e China nos anos Nixon. É sintomático que Estados Unidos, Reino Unido e França estejam voltando-se cada mais para a Índia, país democrático, relativamente estável, economicamente promissor e militarmente forte (por conta de seu imenso exército e de seu arsenal nuclear). Esta aproximação tende a se fazer mais forte com a ascensão da China, para a qual a Índia poderia servir como contrapeso regional (segundo a velha lógica da balança de poder) e com o recrudescimento da instabilidade interna no Paquistão, até o momento o grande aliado dos Estados Unidos na região.
Dessa forma, cortejando o mundo desenvolvido ao mesmo tempo em que se engaja junto ao mundo em desenvolvimento, a Índia prepara cuidadosamente o caminho para sua ascensão à condição de potência mundial, sua "montée en puissance", como dizem os franceses - numa expressão mais conveniente , concisa e sugestiva, aliás... Preparando sua base política, econômica e militar (pacífica), a Índia lança os alicerces de seu projeto de potência, e - com grande grau de possível acerto - figurará como um dos pólos do poder internacional do século XXI.
É interessante notar a atual "crise" (se é que temos uma - tenho pouco conhecimento em economia para arriscar qualquer prognóstico...) que abala os centros financeiros do planeta. Fosse há dez ou quinze anos, as economias em desenvolvimento estariam sendo varridas por uma onda de pessimismo que apresentaria todos os sintomas que são bem conhecidos por todos nós: queda brutal nas bolsas de valores, fuga de capitais, aumento da taxa de câmbio, inflação, queda nas exportações, instabilidade política... Contraste-se esse cenário com o atual: não apenas as economias em desenvolvimento continuam estáveis, mas também são chamadas a desempenhar o papel que outrora fora das economias desenvolvidas, isto é, sustentar o crescimento econômico global para deter a crise. Talvez possa haver um pouco de exagero nesse diagnóstico; mas quem duvida seriamente de que a China, consumidora voraz de produtos primários, a Rússia, grande exportadora de petróleo e gás, a Índia, mercado promissor para o desenvolvimento do setor terciário, especialmente TI, e o Brasil, o grande celeiro do mundo e um dos maiores mercados consumidores do planeta (não apenas em termos de população, mas também de renda per capita de seus cidadãos, quesito em que levamos grande vantagem sobre China e Índia) têm, sim, capacidade para impulsionar uma economia global claudicante?
Das quatro estrelas do futuro mundial, a China parece ser aquela destinada a desempenhar o papel mais importante. Não há analista (bom ou ruim) que não recorra a ela para explicar o mundo daqui a algumas décadas. Talvez por isso, o "BRI" de BRIC acabe sendo relativamente esquecido. Razão maior para esquecimento ocorre no caso da Índia, ofuscada pelo estonteante crescimento chinês justamente por se localizar nas vizinhanças do Império do Meio. Ademais, se Brasil e Rússia contam com um nível de desenvolvimento relativamente - sublinhese-se, relativamente - elevado, a Índia ainda luta para combater o grande flagelo da pobreza: numa economia menor do que a brasileira (US$ 1.1 trilhão contra US$ 906.5 bilhões - dados do FMI), aproximadamente 25% das pessoas estão abaixo da linha de pobreza, o que significa um contingente de mais de 250 milhões de indivíduos, quase 1,5 vez o tamanho da população brasileira, e auferem uma renda per capita de aproximadamente 700 dólares por ano (dados do Banco Mundial). Mas a Índia não é digna de esquecimento...
O que dizer do futuro papel de um país que, em menos de dez dias, recebeu a visita de líderes de duas das mais importantes potências mundiais, Gordon Brown (Reino Unido) e Nicolas Sarkozy (França)? Sem mencionar que uma semana antes, o premiê indiano Manmohan Singh havia sido recebido por Hu Jintao em Pequim. China, Reino Unido e França reafirmaram seus laços de amizade com a Índia, e foram além: a China prometeu manter os exercícios militares conjuntos que ambos os países têm realizado e promover, em 2008, o segundo Diálogo de Defensa China-Índia, além de ter expressado seu apoio às "aspirações da Índia de desempenhar um papel mais importante no âmbito das Nações Unidas, inclusive no Conselho de Segurança" (Joint Statement, 15 de janeiro de 2008. Fonte: PakTribune, http://www.paktribune.com/news/index.shtml?196221); já o Reino Unido e a França reafirmaram seu apoio à entrada da Índia como membro permanente no Conselho de Segurança - apoio que se estende ao G-4 - e se mostraram interssados em aprofundar seus laços econômicos com o país - inclusive na área militar (a França é a segunda maior fornecedora de armamentos para a Índia, atrás de Israel). O que dizer de um país que, a despeito de não ser signatário do TNP, teve seu programa e arsenal nucleares amplamente reconhecidos pela comunidade internacional, inclusive pelos Estados Unidos, com quem Nova Délhi assinou, em 2007, um pacto de cooperação nuclear para fins civis, à espera de aprovação pelo Senado americano? O que dizer de um país que mantém papel ativo, juntamente com o Brasil, nos principais grupos políticos que defendem a reforma de determinadas regras e estruturas do sistema internacional, como o G-4 e o G-20, além de atuar, juntamente com outras duas grandes democracias do mundo em desenvolvimento, no IBAS? Pode-se esperar que este país, a Índia, venha a desempenhar de fato um papel político e econômico muito mais importante do que alguns analistas prevêem (previsões, sempre elas...) para um futuro próximo.
Apesar de conhecer pouco sobre a política externa indiana, parece-me que a Índia tem rompido com alguns paradigmas que até há pouco tempo norteavam sua ação internacional. Outrora um dos grandes líderes do mundo não-alinhado, a Índia na atualidade se pauta por uma ação que visa à universalização de suas relações exteriores, principalmente em direção ao mundo desenvolvido, de quem esteve afastada pelo seu não-alinhamento ativista no MNA e no G-77 e pelo apoio que recebera da União Soviética nos tempos da Guerra Fria, especialmente a partir do cisma sino-soviético nos anos 60, da guerra sino-indiana de 1962 e da política de aproximação dos Estados Unidos e China nos anos Nixon. É sintomático que Estados Unidos, Reino Unido e França estejam voltando-se cada mais para a Índia, país democrático, relativamente estável, economicamente promissor e militarmente forte (por conta de seu imenso exército e de seu arsenal nuclear). Esta aproximação tende a se fazer mais forte com a ascensão da China, para a qual a Índia poderia servir como contrapeso regional (segundo a velha lógica da balança de poder) e com o recrudescimento da instabilidade interna no Paquistão, até o momento o grande aliado dos Estados Unidos na região.
Dessa forma, cortejando o mundo desenvolvido ao mesmo tempo em que se engaja junto ao mundo em desenvolvimento, a Índia prepara cuidadosamente o caminho para sua ascensão à condição de potência mundial, sua "montée en puissance", como dizem os franceses - numa expressão mais conveniente , concisa e sugestiva, aliás... Preparando sua base política, econômica e militar (pacífica), a Índia lança os alicerces de seu projeto de potência, e - com grande grau de possível acerto - figurará como um dos pólos do poder internacional do século XXI.
quarta-feira, 23 de janeiro de 2008
Diálogo Diplomático no "Correio Braziliense"
Caros
A edição de hoje (23/01, pg. 22) do Correio Braziliense traz uma reportagem de página inteira sobre o CACD 2008, incluindo uma entrevista com o Embaixador Fernando Guimarães Reis. Segue abaixo trecho em que a reportagem cita nosso blog. Ressalvo que o Correio só disponibiliza seu conteúdo para assinantes, razão pela qual não reproduzo a reportagem na íntegra. Se conseguir o texto em sua totalidade, postarei no blog tão logo o tenha.
" 'As mudanças [no CACD] evitam surpreender os candidatos com exigências que não sejam compatíveis com a própria natureza do certame', esclarece o diretor do IRBr, embaixador Fernando Guimarães Reis. A orientação de Amorim é para evitar os 'concurseiros de plantão'. 'A idéia é afastar quem não conhece a carreira a fundo ou não tem interesse', avalia o diplomata Fábio Simão Alves, que entrou para o Rio Branco no concurso de 2007. Ele concorda com a democratização da carreira. 'O Itamaraty está selecionando pessoas de diferentes origens sociais e de fora do eixo Rio-São Paulo-Brasília'. Simão criou [sic] o blog dialogodiplomatico.blogspot.com, com dicas para candidatos. Na Internet, os candidatos têm ferramentas para estreitar experiências."
Uma ressalva: os méritos pela criação do blog são todos do Maurício, como bem o sabemos.
Abraços a todos, prossigam nos estudos!
A edição de hoje (23/01, pg. 22) do Correio Braziliense traz uma reportagem de página inteira sobre o CACD 2008, incluindo uma entrevista com o Embaixador Fernando Guimarães Reis. Segue abaixo trecho em que a reportagem cita nosso blog. Ressalvo que o Correio só disponibiliza seu conteúdo para assinantes, razão pela qual não reproduzo a reportagem na íntegra. Se conseguir o texto em sua totalidade, postarei no blog tão logo o tenha.
" 'As mudanças [no CACD] evitam surpreender os candidatos com exigências que não sejam compatíveis com a própria natureza do certame', esclarece o diretor do IRBr, embaixador Fernando Guimarães Reis. A orientação de Amorim é para evitar os 'concurseiros de plantão'. 'A idéia é afastar quem não conhece a carreira a fundo ou não tem interesse', avalia o diplomata Fábio Simão Alves, que entrou para o Rio Branco no concurso de 2007. Ele concorda com a democratização da carreira. 'O Itamaraty está selecionando pessoas de diferentes origens sociais e de fora do eixo Rio-São Paulo-Brasília'. Simão criou [sic] o blog dialogodiplomatico.blogspot.com, com dicas para candidatos. Na Internet, os candidatos têm ferramentas para estreitar experiências."
Uma ressalva: os méritos pela criação do blog são todos do Maurício, como bem o sabemos.
Abraços a todos, prossigam nos estudos!
segunda-feira, 21 de janeiro de 2008
A desmoralização do nacionalismo
As eleições presidenciais sérvias, cujo primeiro turno aconteceu ontem (20/01), opõem duas forças que a imprensa internacional tratou de definir nitidamente: Tomislav Nikolic, "nacionalista", "pró-russo", "radical", "ultraconservador", de um lado, e Boris Tadic, "integracionista", "pró-europeu", "moderado", "liberal". Basta percorrer os olhos sobre as páginas e os sites de alguns importantes e influentes veículos de mídia regional e global (New York Times, Le Monde, El País, Al Jazeera, The Guardian, Folha de São Paulo) para ter-se a impressão de que os epítetos são sempre os mesmos, para um e o outro candidato. Desnecessário dizer quem nos é apresentado como o "mocinho" e quem o é como o "bandido" nesta disputa eleitoral...
Evidente que não coloco em questão essa divisão - ainda que simplista - que a imprensa e os círculos políticos têm manifestado. Quando mais não fosse, porque basta um breve lançar de olhos sobre o passado, as posições, os discursos e as propostas de ambas os candidatos para se entender o porquê de uma tal divisão. Convido o leitor que ainda não conhece os dois candidatos a esse exercício. Mesmo porque está em jogo o futuro de uma região extremamente delicada, a meio caminho da Europa Ocidental, do Oriente Médio e da Rússia.
Pois bem, o objetivo deste artigo não é analisar as eleições sérvias, mas, sim, questionar o porquê da demonização do nacionalismo e sua utilização como etiqueta desmoralizadora e portadora de certo perigo por parte daqueles que com ela são tachados. Por que nacionalismo tem-se tornado, a menos no discurso de muitos, uma força oposta aos valores democráticos e liberais? Por que o nacionalismo está sendo relegado ao limbo político - mais uma vez, pelo menos no discurso?
É tarefa difícil definir nacionalismo. Aceitando-se as idéias de Hobsbawm em seu magistral "Nações e Nacionalismo [...]", pode-se dizer que nacionalismo é uma ideologia segundo a qual o indivíduo deve fidelidade à nação, que não se sujeita, por sua vez, a força exterior alguma, mas apenas à soberania da própria nação/povo. Em sua origem histórica, o nacionalismo é absolutamente indissociável das idéias liberais e democráticas (para os padrões da época, bem entendido) que foram o propulsor teórico-intelectual das Revoluções Inglesa, Americana e Francesa. A partir da Revolução de 1789, o nacionalismo se identifica com as aspirações da classe média urbana liberal, que lutava contra as monarquias do Ancien Régime, fundadas sobre o legitimismo do direito divino dos príncipes, e não sobre o grosso da população que formava a "nação" - este, um conceito que nasce com a própria Revolução. À emancipação do indivíduo correspondia a emancipação da nação, corpo social ligado por elementos obetivos (língua, religição, passado comum etc.) e subjetivos (o sentimento de pertencimento, fundamental, aliás, para Hobsbawm como elemento determinante desta "comunidade imaginada" - Benedict Anderson - que é a nação).
A partir do século XIX, o nacionalismo foi utilizado como força questionadora dos impérios multinacionais que dominavam a Europa Oriental e Central. A nação deveria ser o fundamento da comunidade política, e cada nação/povo tinha o direito de autodeterminar-se, tomando em suas mãos as decisões sobre seu próprio destino e sua configuração sócio-política. Ainda nessa época, nacionalismo era uma ideologia identificada com as forças de esquerda e com os ideias liberais e democráticos, e será o ator principal das Revoluções de 1848, a "Primavera dos Povos".
A partir da década de 1870, com o fim do processo de unificação da Alemanha sob Bismarck, o nacionalismo gradualmente passa a se mover para o outro pólo do espectro político. Este processo, conservador em sua essência, se dava principalmente como resposta ao avanço das ideologias socialistas. Era como se o nacionalismo, até então utilizado como força de propulsão das reformas democráticas na Europa (especialmente Ocidental) passasse a ser utilizado como mecanismo de contenção de reformas mais amplas. O nacionalismo opunha-se a partir de então ao internacionalismo soviético, e assumia contornos cada vez mais conservadores.
Desnecessário comentar os estragos e catástrofes causados no século XX pelos nacionalismos, tanto de esquerda como de direita (nacionalismo de esquerda, sim, por mais paradoxal que possa parecer: a URSS a partir de Stálin é o grande bastião do nacionalismo de esquerda do século XX). Este talvez seja o fato explicativo para a degradação que o nacionalismo, como força política, sofreu, especialmente na Europa. Isso significa, no entanto, que se deva abandonar o nacionalismo, que se deva jogá-lo na lata de lixo da História como ideologia/força/movimento diametralmente oposto aos valores da democracia contemporânea?
Fazê-lo significa ignorar a própria História, na medida em que, como visto, o nacionalismo nasceu como depositário das idéias liberais e iluministas, e atuou como tal no campo político por quase um século. O que se deve rejeitar, sim, são os excessos abertamente antidemocráticos legitimados em nome da nação, como a xenofobia. Em nome do nacionalismo, legitimaram-se os maiores massacres - guerras, conflitos, genocídios, a terminologia não importa neste momento - de que o homem foi, ao mesmo tempo, perpetrador e vítima.
O mundo, no entanto, é, como desde sempre, dividio em comunidades que se concebem a si próprias como únicas, diferentes de todas as demais. Na atualidade, estas comunidades são os Estados nacionais. A nação, em essência, é a comunidade que encontra expressão política no Estado, e não mais se funda sobre elementos como a língua, religião etc. - basta um olhar rápido sobre os Estados multiétnicos (se é que etnia ainda é um conceito a ser levado em consideração...), multilingüísticos, multi-religiosos, "multinacionais", em essência. A despeito do integracionismo e do globalismo, o nacionalismo é uma força poderosa que continua mobilizando mentes e corações de bilhões de pessoas em todo o globo. É uma força saudável, como toda força que mantenha a coesão interna de um corpo social que se imagina único; e como tal, é da mesma essência das forças que mantiveram unidos tribos, clãs, feudos, reinos e toda uma miríade de comunidades em que o homem se agrupou desde que se descobriu um zoon politikon, na terminologia de Aristóteles.
O nacionalismo está presente, e se manifesta das mais variadas formas: uma bandeira americana pendurada no alpendre de uma casa, a magia que leva 180 milhões de pessoas a se reunirem diante de um aparelho de TV de quatro em quatro anos, o espetáculo dos Jogos Olímpicos e do desfile de mais de 200 delegações, todas orgulhosamente portando sua bandeira e representando sua "nação", o voluntarismo de milhares de jovens que arriscam suas vidas no Oriente Médio por sua "nação", o culto de panthéons e monumentos aos heróis "nacionais", o zelo com que se realiza plebiscito para se decidir sobre a letra de um hino "nacional" (como aconteceu recentemente na Espanha), o extremismo radical que sustenta grupos como o ETA, entre tantos outros. Em si mesmo, o nacionalismo não é uma ideologia xenófoba, anti-democrática e antiliberal. Como todas as coisas à disposição do homem, os problemas nascem dos usos que a ele conferimos. É necessário cuidado, portanto, quando se demoniza o nacionalismo. Vale não esquecer que todos nós a ele nos apegamos - e que seja de forma saudável e racional.
Evidente que não coloco em questão essa divisão - ainda que simplista - que a imprensa e os círculos políticos têm manifestado. Quando mais não fosse, porque basta um breve lançar de olhos sobre o passado, as posições, os discursos e as propostas de ambas os candidatos para se entender o porquê de uma tal divisão. Convido o leitor que ainda não conhece os dois candidatos a esse exercício. Mesmo porque está em jogo o futuro de uma região extremamente delicada, a meio caminho da Europa Ocidental, do Oriente Médio e da Rússia.
Pois bem, o objetivo deste artigo não é analisar as eleições sérvias, mas, sim, questionar o porquê da demonização do nacionalismo e sua utilização como etiqueta desmoralizadora e portadora de certo perigo por parte daqueles que com ela são tachados. Por que nacionalismo tem-se tornado, a menos no discurso de muitos, uma força oposta aos valores democráticos e liberais? Por que o nacionalismo está sendo relegado ao limbo político - mais uma vez, pelo menos no discurso?
É tarefa difícil definir nacionalismo. Aceitando-se as idéias de Hobsbawm em seu magistral "Nações e Nacionalismo [...]", pode-se dizer que nacionalismo é uma ideologia segundo a qual o indivíduo deve fidelidade à nação, que não se sujeita, por sua vez, a força exterior alguma, mas apenas à soberania da própria nação/povo. Em sua origem histórica, o nacionalismo é absolutamente indissociável das idéias liberais e democráticas (para os padrões da época, bem entendido) que foram o propulsor teórico-intelectual das Revoluções Inglesa, Americana e Francesa. A partir da Revolução de 1789, o nacionalismo se identifica com as aspirações da classe média urbana liberal, que lutava contra as monarquias do Ancien Régime, fundadas sobre o legitimismo do direito divino dos príncipes, e não sobre o grosso da população que formava a "nação" - este, um conceito que nasce com a própria Revolução. À emancipação do indivíduo correspondia a emancipação da nação, corpo social ligado por elementos obetivos (língua, religição, passado comum etc.) e subjetivos (o sentimento de pertencimento, fundamental, aliás, para Hobsbawm como elemento determinante desta "comunidade imaginada" - Benedict Anderson - que é a nação).
A partir do século XIX, o nacionalismo foi utilizado como força questionadora dos impérios multinacionais que dominavam a Europa Oriental e Central. A nação deveria ser o fundamento da comunidade política, e cada nação/povo tinha o direito de autodeterminar-se, tomando em suas mãos as decisões sobre seu próprio destino e sua configuração sócio-política. Ainda nessa época, nacionalismo era uma ideologia identificada com as forças de esquerda e com os ideias liberais e democráticos, e será o ator principal das Revoluções de 1848, a "Primavera dos Povos".
A partir da década de 1870, com o fim do processo de unificação da Alemanha sob Bismarck, o nacionalismo gradualmente passa a se mover para o outro pólo do espectro político. Este processo, conservador em sua essência, se dava principalmente como resposta ao avanço das ideologias socialistas. Era como se o nacionalismo, até então utilizado como força de propulsão das reformas democráticas na Europa (especialmente Ocidental) passasse a ser utilizado como mecanismo de contenção de reformas mais amplas. O nacionalismo opunha-se a partir de então ao internacionalismo soviético, e assumia contornos cada vez mais conservadores.
Desnecessário comentar os estragos e catástrofes causados no século XX pelos nacionalismos, tanto de esquerda como de direita (nacionalismo de esquerda, sim, por mais paradoxal que possa parecer: a URSS a partir de Stálin é o grande bastião do nacionalismo de esquerda do século XX). Este talvez seja o fato explicativo para a degradação que o nacionalismo, como força política, sofreu, especialmente na Europa. Isso significa, no entanto, que se deva abandonar o nacionalismo, que se deva jogá-lo na lata de lixo da História como ideologia/força/movimento diametralmente oposto aos valores da democracia contemporânea?
Fazê-lo significa ignorar a própria História, na medida em que, como visto, o nacionalismo nasceu como depositário das idéias liberais e iluministas, e atuou como tal no campo político por quase um século. O que se deve rejeitar, sim, são os excessos abertamente antidemocráticos legitimados em nome da nação, como a xenofobia. Em nome do nacionalismo, legitimaram-se os maiores massacres - guerras, conflitos, genocídios, a terminologia não importa neste momento - de que o homem foi, ao mesmo tempo, perpetrador e vítima.
O mundo, no entanto, é, como desde sempre, dividio em comunidades que se concebem a si próprias como únicas, diferentes de todas as demais. Na atualidade, estas comunidades são os Estados nacionais. A nação, em essência, é a comunidade que encontra expressão política no Estado, e não mais se funda sobre elementos como a língua, religião etc. - basta um olhar rápido sobre os Estados multiétnicos (se é que etnia ainda é um conceito a ser levado em consideração...), multilingüísticos, multi-religiosos, "multinacionais", em essência. A despeito do integracionismo e do globalismo, o nacionalismo é uma força poderosa que continua mobilizando mentes e corações de bilhões de pessoas em todo o globo. É uma força saudável, como toda força que mantenha a coesão interna de um corpo social que se imagina único; e como tal, é da mesma essência das forças que mantiveram unidos tribos, clãs, feudos, reinos e toda uma miríade de comunidades em que o homem se agrupou desde que se descobriu um zoon politikon, na terminologia de Aristóteles.
O nacionalismo está presente, e se manifesta das mais variadas formas: uma bandeira americana pendurada no alpendre de uma casa, a magia que leva 180 milhões de pessoas a se reunirem diante de um aparelho de TV de quatro em quatro anos, o espetáculo dos Jogos Olímpicos e do desfile de mais de 200 delegações, todas orgulhosamente portando sua bandeira e representando sua "nação", o voluntarismo de milhares de jovens que arriscam suas vidas no Oriente Médio por sua "nação", o culto de panthéons e monumentos aos heróis "nacionais", o zelo com que se realiza plebiscito para se decidir sobre a letra de um hino "nacional" (como aconteceu recentemente na Espanha), o extremismo radical que sustenta grupos como o ETA, entre tantos outros. Em si mesmo, o nacionalismo não é uma ideologia xenófoba, anti-democrática e antiliberal. Como todas as coisas à disposição do homem, os problemas nascem dos usos que a ele conferimos. É necessário cuidado, portanto, quando se demoniza o nacionalismo. Vale não esquecer que todos nós a ele nos apegamos - e que seja de forma saudável e racional.
sexta-feira, 18 de janeiro de 2008
Questões de Segurança na América Latina
A América Latina é tradicionalmente uma região estável e pacífica, quando comparada com os demais continentes. Com efeito, talvez seja a região mais pacífica do mundo, diante da ausência de guerras inter-estatais, do baixo nível dos conflitos políticos e diplomáticos, da presença de estruturas institucionais para a solução pacífica de controvérsias e do baixo gasto armamentista pelos países da região.
Isso não significa, no entanto, que as questões de segurança estejam ausentes da agenda política da latino-americana. O objetivo deste texto é discutir algumas dessas questões, analisando-as também a partir da perspectiva da política externa brasileira. Não é demais lembrar que oescrevo em caráter estritamente pessoal, e que as opiniões aqui expressas não necessariamente refletem as opiniões do Governo Brasileiro.
Desde o final da Guerra Fria, a agenda internacional de segurança tem passado por sensíveis alterações - como de resto a própria política internacional. As noções e concepções de segurança clássica, que envolve basicamente a guerra entre Estados, têm cedido lugar claramente ao que se tem convencionado chamar de novos temas: a guerra entre Estados deixou de ser a grande ameaça da política internacional de segurança, e novas (e às vezes inusitadas) ameaças (re-)emergiram: narcotráfico, terrorismo, crime transnacional, movimentos de refugiados, epidemias, desastres climáticos etc. Na atualidade, a comunidade internacional se vê obrigada a lidar com uma gama muito mais vasta de ameaças e desafios, algo reconhecido no famoso relatório In Larger Freedom (2004), do ex-secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan. Vive-se, com efeito, uma época em que a segurança se reveste de um caráter verdadeiramente multidimensional.
Tendo esses conceitos em mente, parece válido afirmar que as questões de segurança na América Latina são muito mais atinentes a essas novas ameaças do que à concepção clássica de segurança, em que o conflito inter-estatal desempenha papel fundamental. Aqui, por exemplo, o narcotráfico é uma ameaça muito mais premente do que a guerra ou os conflitos de cunho político armados, especialmente para alguns países da região (como o exemplo óbvio da Colômbia, mas também o Brasil, onde a violência a que assistimos diariamente em nossos televisores tem como raiz o narcotráfico internacional). O crime transnacional - que encontra em alguns paraísos fiscais em países da região ambiente propício para proteger seus negócios -, bem como as ameaças climáticas - que atingem a região mais rica do planeta em biodiversidade, em reservas de água doce, em reservas de água subterrânea etc. - são, entre tantas outras, ameaças que parecem exigir mais atenção dos governos da região do que conflitos inter-estatais.
Ainda assim, seria enganoso pensar que os conflitos "clássicos" de segurança estão ausentes da América Latina. Em sua grande maioria, estão fundamentados em conflitos fronteiriços que há décadas - séculos, em alguns casos - permanecem sem solução. No Cone Sul, Argentina e Chile disputam zonas ao sul de seus territórios, especialmente o Canal de Beagles, próximo à Terra do Fogo; na região amazônica, Equador e Peru disputam uma extensa faixa de território, o que inclusive levou os dois países a um conflito armado de pequenas proporções em meados dos anos 90; também na região amazônica, a Venezuela reclama quase um terço do território da Guiana, na região de Essequibo; finalmente, o conflito fronteiriço mais longo e mais persistente envolve o Peru, a Bolívia e o Chile, e tem raízes na guerra do Pacífico, que envolveu os três países de 1879 a 1881.
A Venezuela é, atualmente, o centro das questões de segurança na América Latina. Pode-se conjecturar sobre suas causas, mas é fato inegável que a Venezuela tem promovido um rearmamento notável - a compra de 100.000 fuzis Kalashnikov e quase duas dúzias de caças russos Sukhoi foram os movimentos mais espetaculares - e midiáticos - dessa política levada a cabo por Caracas. Parece-me, no entanto, que a Venezuela comporta muito menos riscos para a região do que querem fazer-nos crer alguns setores, nacionais e estrangeiros. Com efeito - e isso é opinião pessoal -, parece-me que o rearmamento da Venezuela tem como alvo o público interno venezuelano e, principalmente, o estamento militar, uma das bases de sustentação da "revolução bolivariana".
A retórica do Presidente Hugo Chávez Frías se dirige contra o "imperialismo americano" e suas ameaças, mas parece muitíssimo pouco provável que haja uma invasão estrangeira na Venezuela, promovida pelos Estados Unidos ou por qualquer outro país. Basta lembrar que a Venezuela é um dos maiores fornecedores de petróleo para os Estados Unidos, e nem um nem outro país têm interesse em interromper esse lucrativo negócio. Da mesma forma, é implausível imaginar que Washington promoveria a invasão de um país latino-americano - abrir uma terceira frente de guerra enquanto o Oriente Médio continua mergulhado na instabilidade? e fundamentar a invasão em quais motivos?
Do lado oposto, existe o receio de que o armamentism venezuelano nao seja defensivo, mas, antes, ofensivo - ou seja, a Venezuela comportaria riscos a seus vizinhos. Outra vez, creio que seja improvável. Nem a Venezuela tem tanta capacidade de projeção de poder, nem os vizinhos latino-americanos se sujeitariam a assistir impassíveis a atos de agressão e de guerra na região. Lembremos que o conflito perúvio-equatoriano de 1994 envolveu imediatamente a ação diplomática e política de países da região, como a Argentina e o Brasil, bem como dos Estados Unidos. Felizmente, a América Latina conta com uma série de mecanismos de governança e solução de conflitos que atuariam energicamente em caso de violação, por um de seus membros, da regra basilar da renúncia ao uso da força.
Vizinha à Venezuela, a Colômbia enfrenta há mais de quatro décadas o maior e mais sangrento conflito armado latino-americano das últimas décadas - apenas nos últimos 15 anos, foram mais de 20.000 mortos. As duas guerrilhas que ainda continuam ativas no país - as Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC) e o Ejército de Liberación Nacional (ELN) controlam de 20% a 30% do território colombiano e, alimentando-se do narcotráfico, impingem ao país um sangrento conflito civil, que conta também com a atuação de forças paramilitares de direita. O combate às guerrilhas pelo governo colombiano tem contado com o apoio dos Estados Unidos, que, por meio do Plano Colômbia, concedem armas e capitais ao governo de Bogotá, garantindo a Washington uma presença ativa nesta região do continente.
Para além da América do Sul, o Caribe também comporta algumas das mais importantes questões de segurança latino-americana. A região, bem como o istmo centro-americano, foi palco, nos anos da Guerra Fria, de inúmeros conflitos, que quase sempre contaram com a intervenção dos Estados Unidos: Nicarágua, Granada, Guatemala, Honduras etc. Nos anos 90, muitos desses conflitos foram solucionados pela ação de forças de paz nas Nações Unidas, bem como pela atuação político-diplomática de países da região - vale a pena lembrar que os conflitos nicaragüenses ensejaram a criação do Grupo de Contadora e do Grupo de Apoio, que fundiram-se no Grupo do Rio, um dos mais importantes mecanismos de concertação diplomática e política entre os países latino-americanos.
O Haiti tem sido fonte de instabilidade desde os anos 90 na região, e já foi palco de duas intervenções legítimas da comunidade internacional - uma em 1994 e outra em 2004, esta por meio da MINUSTAH, força de paz comandada pelo Brasil. O progresso do país rumo à normalidade político-institucional democrática é um alento para um povo mergulhado em gravíssimos problemas sociais, políticos e econômicos. O trabalho das Nações Unidas, em geral, e do Brasil, em particular, merece respeito e elogios.
Um palco de possíveis conflitos - graves em potencial - parece ser Cuba. A situação de saúde de Fidel Castro parece apontar para a saída de cena do general que há quase 50 anos comanda a ilha. Fazer qualquer prognóstico sobre o futuro da ilha após o desaparecimento de Castro da cena política cubana é arriscado, mas é um exercício válido de imaginação. O que acontecerá? Raúl Castro assumirá o lugar do irmão por um processo normal? Os Estados Unidos intervirão na ilha? Se sim, fá-lo-ão militarmente? Cuba se conduzirá a si própria a um regime democrático por meio de um processo de abertura política, similar a sua lenta, mas notável, abertura econômica?
Cuba é um dos últimos - se não o último - bastião da Guerra Fria, e prova ser um desafio ao orgulho nacional dos Estados Unidos. Mais do que isso, a instabilidade na ilha poderá levar milhares de refugiados a buscarem o caminho da Flórida para fugir de uma situação de colapso político. Vale a pena lembrar que o medo de que refugiados aportassem nas praias americanas de forma descontrolada foi um dos fatores que fizeram os Estados Unidos pressionar o Conselho de Segurança por uma intervenção no Haiti em 1994.
Região tradicionalmente pacífica, a América Latina ainda assim comporta ameaças e desafios - antigos e novos, "clássicos" ou "multidimensionais" -, que merecem a devida atenção de todos os governos da região. O Brasil não é a exceção. A despeito dos alardes criados aqui e acolá, o Brasil continua sendo o país militar e politicamente mais influente da região (descontando-se, é óbvio, potências extra-regionais com presença marcante no continente, como os Estados Unidos), e mantém sua capacidade de projeção de poder diplomático e, mesmo, militar. Evidente que o país não tem qualquer pretensão de exercício de força - mas a manutenção dessa capacidade é crucial para sua política externa e para o processo de integração sul-americano, que precisa fazer frente aos dissensos que ainda opõem países que devem ser parceiros nesta empreitada fundamental para a promoção de nossos interesses comuns. E isso não é retórica: uma América Latina próspera, unida e pacífica é condição fundamental para a inserção dos países na região num sistema internacional ainda indefinido, obscuro, cuja única tendência que parece certa - até o momento - é o adensamento da interdependência entre os Estados e os povos. A estratégia do "dividir para governar" só poderá ser evitada na América Latina pela sinergia e pela união de suas nações. Pré-condição, também, para se fazer frente conjuntamente às outras ameaças que acometem a todos indiscriminadamente, tal como o narcotráfico e as ameaças ambientais. Assim como na política e na economia, também na segurança é recomendável que haja uma comunhão latino-americana - ou, ao menos, sul-americana.
Um artigo (curto, mas interessante) sobre o assunto pode ser encontrada na Revista Panorama da Conjuntura Internacional: "A América do Sul Estratégica", de Mario Cesar Flores. GACINT-USP, nº 32, 2007, http://www.usp.br/ccint/gacint/panorama40-31.htm.
Isso não significa, no entanto, que as questões de segurança estejam ausentes da agenda política da latino-americana. O objetivo deste texto é discutir algumas dessas questões, analisando-as também a partir da perspectiva da política externa brasileira. Não é demais lembrar que oescrevo em caráter estritamente pessoal, e que as opiniões aqui expressas não necessariamente refletem as opiniões do Governo Brasileiro.
Desde o final da Guerra Fria, a agenda internacional de segurança tem passado por sensíveis alterações - como de resto a própria política internacional. As noções e concepções de segurança clássica, que envolve basicamente a guerra entre Estados, têm cedido lugar claramente ao que se tem convencionado chamar de novos temas: a guerra entre Estados deixou de ser a grande ameaça da política internacional de segurança, e novas (e às vezes inusitadas) ameaças (re-)emergiram: narcotráfico, terrorismo, crime transnacional, movimentos de refugiados, epidemias, desastres climáticos etc. Na atualidade, a comunidade internacional se vê obrigada a lidar com uma gama muito mais vasta de ameaças e desafios, algo reconhecido no famoso relatório In Larger Freedom (2004), do ex-secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan. Vive-se, com efeito, uma época em que a segurança se reveste de um caráter verdadeiramente multidimensional.
Tendo esses conceitos em mente, parece válido afirmar que as questões de segurança na América Latina são muito mais atinentes a essas novas ameaças do que à concepção clássica de segurança, em que o conflito inter-estatal desempenha papel fundamental. Aqui, por exemplo, o narcotráfico é uma ameaça muito mais premente do que a guerra ou os conflitos de cunho político armados, especialmente para alguns países da região (como o exemplo óbvio da Colômbia, mas também o Brasil, onde a violência a que assistimos diariamente em nossos televisores tem como raiz o narcotráfico internacional). O crime transnacional - que encontra em alguns paraísos fiscais em países da região ambiente propício para proteger seus negócios -, bem como as ameaças climáticas - que atingem a região mais rica do planeta em biodiversidade, em reservas de água doce, em reservas de água subterrânea etc. - são, entre tantas outras, ameaças que parecem exigir mais atenção dos governos da região do que conflitos inter-estatais.
Ainda assim, seria enganoso pensar que os conflitos "clássicos" de segurança estão ausentes da América Latina. Em sua grande maioria, estão fundamentados em conflitos fronteiriços que há décadas - séculos, em alguns casos - permanecem sem solução. No Cone Sul, Argentina e Chile disputam zonas ao sul de seus territórios, especialmente o Canal de Beagles, próximo à Terra do Fogo; na região amazônica, Equador e Peru disputam uma extensa faixa de território, o que inclusive levou os dois países a um conflito armado de pequenas proporções em meados dos anos 90; também na região amazônica, a Venezuela reclama quase um terço do território da Guiana, na região de Essequibo; finalmente, o conflito fronteiriço mais longo e mais persistente envolve o Peru, a Bolívia e o Chile, e tem raízes na guerra do Pacífico, que envolveu os três países de 1879 a 1881.
A Venezuela é, atualmente, o centro das questões de segurança na América Latina. Pode-se conjecturar sobre suas causas, mas é fato inegável que a Venezuela tem promovido um rearmamento notável - a compra de 100.000 fuzis Kalashnikov e quase duas dúzias de caças russos Sukhoi foram os movimentos mais espetaculares - e midiáticos - dessa política levada a cabo por Caracas. Parece-me, no entanto, que a Venezuela comporta muito menos riscos para a região do que querem fazer-nos crer alguns setores, nacionais e estrangeiros. Com efeito - e isso é opinião pessoal -, parece-me que o rearmamento da Venezuela tem como alvo o público interno venezuelano e, principalmente, o estamento militar, uma das bases de sustentação da "revolução bolivariana".
A retórica do Presidente Hugo Chávez Frías se dirige contra o "imperialismo americano" e suas ameaças, mas parece muitíssimo pouco provável que haja uma invasão estrangeira na Venezuela, promovida pelos Estados Unidos ou por qualquer outro país. Basta lembrar que a Venezuela é um dos maiores fornecedores de petróleo para os Estados Unidos, e nem um nem outro país têm interesse em interromper esse lucrativo negócio. Da mesma forma, é implausível imaginar que Washington promoveria a invasão de um país latino-americano - abrir uma terceira frente de guerra enquanto o Oriente Médio continua mergulhado na instabilidade? e fundamentar a invasão em quais motivos?
Do lado oposto, existe o receio de que o armamentism venezuelano nao seja defensivo, mas, antes, ofensivo - ou seja, a Venezuela comportaria riscos a seus vizinhos. Outra vez, creio que seja improvável. Nem a Venezuela tem tanta capacidade de projeção de poder, nem os vizinhos latino-americanos se sujeitariam a assistir impassíveis a atos de agressão e de guerra na região. Lembremos que o conflito perúvio-equatoriano de 1994 envolveu imediatamente a ação diplomática e política de países da região, como a Argentina e o Brasil, bem como dos Estados Unidos. Felizmente, a América Latina conta com uma série de mecanismos de governança e solução de conflitos que atuariam energicamente em caso de violação, por um de seus membros, da regra basilar da renúncia ao uso da força.
Vizinha à Venezuela, a Colômbia enfrenta há mais de quatro décadas o maior e mais sangrento conflito armado latino-americano das últimas décadas - apenas nos últimos 15 anos, foram mais de 20.000 mortos. As duas guerrilhas que ainda continuam ativas no país - as Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC) e o Ejército de Liberación Nacional (ELN) controlam de 20% a 30% do território colombiano e, alimentando-se do narcotráfico, impingem ao país um sangrento conflito civil, que conta também com a atuação de forças paramilitares de direita. O combate às guerrilhas pelo governo colombiano tem contado com o apoio dos Estados Unidos, que, por meio do Plano Colômbia, concedem armas e capitais ao governo de Bogotá, garantindo a Washington uma presença ativa nesta região do continente.
Para além da América do Sul, o Caribe também comporta algumas das mais importantes questões de segurança latino-americana. A região, bem como o istmo centro-americano, foi palco, nos anos da Guerra Fria, de inúmeros conflitos, que quase sempre contaram com a intervenção dos Estados Unidos: Nicarágua, Granada, Guatemala, Honduras etc. Nos anos 90, muitos desses conflitos foram solucionados pela ação de forças de paz nas Nações Unidas, bem como pela atuação político-diplomática de países da região - vale a pena lembrar que os conflitos nicaragüenses ensejaram a criação do Grupo de Contadora e do Grupo de Apoio, que fundiram-se no Grupo do Rio, um dos mais importantes mecanismos de concertação diplomática e política entre os países latino-americanos.
O Haiti tem sido fonte de instabilidade desde os anos 90 na região, e já foi palco de duas intervenções legítimas da comunidade internacional - uma em 1994 e outra em 2004, esta por meio da MINUSTAH, força de paz comandada pelo Brasil. O progresso do país rumo à normalidade político-institucional democrática é um alento para um povo mergulhado em gravíssimos problemas sociais, políticos e econômicos. O trabalho das Nações Unidas, em geral, e do Brasil, em particular, merece respeito e elogios.
Um palco de possíveis conflitos - graves em potencial - parece ser Cuba. A situação de saúde de Fidel Castro parece apontar para a saída de cena do general que há quase 50 anos comanda a ilha. Fazer qualquer prognóstico sobre o futuro da ilha após o desaparecimento de Castro da cena política cubana é arriscado, mas é um exercício válido de imaginação. O que acontecerá? Raúl Castro assumirá o lugar do irmão por um processo normal? Os Estados Unidos intervirão na ilha? Se sim, fá-lo-ão militarmente? Cuba se conduzirá a si própria a um regime democrático por meio de um processo de abertura política, similar a sua lenta, mas notável, abertura econômica?
Cuba é um dos últimos - se não o último - bastião da Guerra Fria, e prova ser um desafio ao orgulho nacional dos Estados Unidos. Mais do que isso, a instabilidade na ilha poderá levar milhares de refugiados a buscarem o caminho da Flórida para fugir de uma situação de colapso político. Vale a pena lembrar que o medo de que refugiados aportassem nas praias americanas de forma descontrolada foi um dos fatores que fizeram os Estados Unidos pressionar o Conselho de Segurança por uma intervenção no Haiti em 1994.
Região tradicionalmente pacífica, a América Latina ainda assim comporta ameaças e desafios - antigos e novos, "clássicos" ou "multidimensionais" -, que merecem a devida atenção de todos os governos da região. O Brasil não é a exceção. A despeito dos alardes criados aqui e acolá, o Brasil continua sendo o país militar e politicamente mais influente da região (descontando-se, é óbvio, potências extra-regionais com presença marcante no continente, como os Estados Unidos), e mantém sua capacidade de projeção de poder diplomático e, mesmo, militar. Evidente que o país não tem qualquer pretensão de exercício de força - mas a manutenção dessa capacidade é crucial para sua política externa e para o processo de integração sul-americano, que precisa fazer frente aos dissensos que ainda opõem países que devem ser parceiros nesta empreitada fundamental para a promoção de nossos interesses comuns. E isso não é retórica: uma América Latina próspera, unida e pacífica é condição fundamental para a inserção dos países na região num sistema internacional ainda indefinido, obscuro, cuja única tendência que parece certa - até o momento - é o adensamento da interdependência entre os Estados e os povos. A estratégia do "dividir para governar" só poderá ser evitada na América Latina pela sinergia e pela união de suas nações. Pré-condição, também, para se fazer frente conjuntamente às outras ameaças que acometem a todos indiscriminadamente, tal como o narcotráfico e as ameaças ambientais. Assim como na política e na economia, também na segurança é recomendável que haja uma comunhão latino-americana - ou, ao menos, sul-americana.
Um artigo (curto, mas interessante) sobre o assunto pode ser encontrada na Revista Panorama da Conjuntura Internacional: "A América do Sul Estratégica", de Mario Cesar Flores. GACINT-USP, nº 32, 2007, http://www.usp.br/ccint/gacint/panorama40-31.htm.
terça-feira, 15 de janeiro de 2008
MATERIAL DE POLÍTICA INTERNACIONAL
O site da Fundação Alexandre de Gusmão disponibiliza gratuitamente os textos apresentados nas duas Conferências Nacionais de Política Externa e Política Internacional. Há textos dos acadêmicos mais importantes da área no país em relação a todos os continentes, material de altíssima utilidade tanto para os diplomatas quanto para a prova de Política Internacional do CACD, na primeira e na terceira fases:
O link é:
http://www.funag.gov.br/ii-conferencia-nacional-de-politica-externa-e-politica-internacional-cnpepi
O link é:
http://www.funag.gov.br/ii-conferencia-nacional-de-politica-externa-e-politica-internacional-cnpepi
domingo, 13 de janeiro de 2008
DIÁLOGO DIPLOMÁTICO NA IMPRENSA
Reproduzo aqui reportagem sobre o CACD do jornal Zero Hora, do Rio Grande do Sul, que cita o nosso blog.
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janeiro de 2008 N° 15478AlertaVoltar para a edição de hoje
Concursos
O caminho do Itamaraty
Instituto Rio Branco abre inscrições de concurso para diplomatas
Dedicação, muita leitura, preparo psicológico para suportar uma rotina estressante de estudos e persistir mesmo após mais de uma reprovação, até ter sucesso. São essas algumas das prerrogativas para quem vai tentar a disputada carreira diplomática, começando como terceiro secretário no Instituto Rio Branco (IRBr), instituição de ensino ligada ao Ministério das Relações Exteriores.Com inscrições abertas na próxima segunda-feira, a seleção já foi vencida por gaúchos como Rita de Curtis, 26 anos. Formada em direito e jornalismo há três anos e acostumada a estudar simultaneamente para dois cursos superiores, em 2005 decidiu que iria tentar a carreira diplomática. Pela imprensa, descobriu com um mês de antecedência que haveria seleção para o Rio Branco naquele ano e começou a se preparar para a prova de 2006. Em Brasília, fez curso preparatório. Reprovada na primeira fase do concurso, Rita voltou para Porto Alegre, onde ficou três meses, e seguiu estudando: - Consegui bolsa de estudos em um curso no Rio de Janeiro. O curso preparatório é importante. É como um técnico para um atleta. Você se preocupa apenas em estudar, e alguém vai te orientando, dando dicas, passando os livros que são necessários ler.Ela conta que chegou a estudar 14 horas por dia na preparação para algumas provas e aniquilou a vida social durante certo tempo para se dedicar à seleção. Foi aprovada em 2007. Muitos, porém, tentam meia dúzia de vezes até conseguir ou desistem pelo caminho.Não menos sacrifícios fez Maurício Costa, 31 anos, formado em Letras, outro gaúcho aprovado na seleção do ano passado, na qual 8,6 mil pessoas concorreram a apenas 105 vagas - uma disputa de 82,5 candidatos por vaga. A aprovação veio depois de três tentativas. O horário de estudo disputava espaço com o trabalho e o mestrado.- Meus cabelos branquearam naquela época. Não é fácil, mas é possível para quem se dedica. Eu sou de família humilde e sempre estudei em escolas públicas de periferia - diz Costa.Hoje, além das atividades no IRBr, Costa dá aulas em um curso preparatório, em Brasília. Com dois amigos, criou um blog (dialogodiplomatico.blogspot.com) para ajudar quem quer seguir o caminho do Itamaraty:- É para ajudar estudantes que estão fora dos grandes centros. Infelizmente, os cursos preparatórios específicos estão em Brasília, São Paulo e Rio.Aberta a candidatos com graduação superior em qualquer curso, a seleção tem quatro etapas. A primeira será uma prova objetiva, em 27 de fevereiro, com temas como português, história, geografia, política internacional, inglês, noções de direito e economia. - No conjunto das provas, procuramos avaliar muito mais a capacidade de articulação das idéias, verificar a maturidade intelectual do candidato do que fazer com que ele reproduza um conhecimento memorizado, inclusive na prova objetiva - diz o coordenador do concurso, Geraldo Tupynambá, do IRBr.
THIAGO COPETTI
O concurso
Prazo: 14 de janeiro a 14 de fevereiro
Cargo e vagas: terceiro secretário/diplomata (115)
Inscrições: pelo site www.cespe.unb.br/concursos
Taxa de inscrição: R$ 120
Informações: http://www.irbr.mre.gov.br/
Carreira: o aprovado cursará o mestrado profissionalizante em diplomacia do IRBr e começará com salário inicial de R$ 7.751,97. Ao longo da carreira, fará cursos obrigatórios de aperfeiçoamento, podendo chegar ao cargo de ministro de primeira classe (embaixador).
As dicas de quem chegou lá
Não se limite a estudar uma ou outra matéria. É preciso ser bom em tudo.
Leia muito. De prioridade à bibliografia recomendada. Em três anos, até ser aprovado em 2007, Maurício Costa leu 87 livros, alguns mais de uma vez.
Esteja preparado para muito sacrifício. A resistência psicológica é tão importante como o estudo. Para reduzir o estresse, Rita de Curtis opta por não estudar nada na véspera.
Jornais e revistas são fundamentais para conhecer atualidades.
É preciso escrever bem e sobre tudo. Leia bons livros. Para quem está em Porto Alegre, Costa recomenda a biblioteca do Centro Universitário Metodista/Ipa (Cel. Joaquim Pedro Salgado, 80), que fica aberta 24 horas, incluindo sábados, domingos e feriados. Outra dica é utilizar as bibliotecas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Quando fez as provas, Costa encontrou toda a bibliografia nas bibliotecas da universidade.
No dia 21 de janeiro, o IRBr divulgará no site http://www.irbr.mre.gov.br/ um guia de estudos com orientação para as provas.
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janeiro de 2008 N° 15478AlertaVoltar para a edição de hoje
Concursos
O caminho do Itamaraty
Instituto Rio Branco abre inscrições de concurso para diplomatas
Dedicação, muita leitura, preparo psicológico para suportar uma rotina estressante de estudos e persistir mesmo após mais de uma reprovação, até ter sucesso. São essas algumas das prerrogativas para quem vai tentar a disputada carreira diplomática, começando como terceiro secretário no Instituto Rio Branco (IRBr), instituição de ensino ligada ao Ministério das Relações Exteriores.Com inscrições abertas na próxima segunda-feira, a seleção já foi vencida por gaúchos como Rita de Curtis, 26 anos. Formada em direito e jornalismo há três anos e acostumada a estudar simultaneamente para dois cursos superiores, em 2005 decidiu que iria tentar a carreira diplomática. Pela imprensa, descobriu com um mês de antecedência que haveria seleção para o Rio Branco naquele ano e começou a se preparar para a prova de 2006. Em Brasília, fez curso preparatório. Reprovada na primeira fase do concurso, Rita voltou para Porto Alegre, onde ficou três meses, e seguiu estudando: - Consegui bolsa de estudos em um curso no Rio de Janeiro. O curso preparatório é importante. É como um técnico para um atleta. Você se preocupa apenas em estudar, e alguém vai te orientando, dando dicas, passando os livros que são necessários ler.Ela conta que chegou a estudar 14 horas por dia na preparação para algumas provas e aniquilou a vida social durante certo tempo para se dedicar à seleção. Foi aprovada em 2007. Muitos, porém, tentam meia dúzia de vezes até conseguir ou desistem pelo caminho.Não menos sacrifícios fez Maurício Costa, 31 anos, formado em Letras, outro gaúcho aprovado na seleção do ano passado, na qual 8,6 mil pessoas concorreram a apenas 105 vagas - uma disputa de 82,5 candidatos por vaga. A aprovação veio depois de três tentativas. O horário de estudo disputava espaço com o trabalho e o mestrado.- Meus cabelos branquearam naquela época. Não é fácil, mas é possível para quem se dedica. Eu sou de família humilde e sempre estudei em escolas públicas de periferia - diz Costa.Hoje, além das atividades no IRBr, Costa dá aulas em um curso preparatório, em Brasília. Com dois amigos, criou um blog (dialogodiplomatico.blogspot.com) para ajudar quem quer seguir o caminho do Itamaraty:- É para ajudar estudantes que estão fora dos grandes centros. Infelizmente, os cursos preparatórios específicos estão em Brasília, São Paulo e Rio.Aberta a candidatos com graduação superior em qualquer curso, a seleção tem quatro etapas. A primeira será uma prova objetiva, em 27 de fevereiro, com temas como português, história, geografia, política internacional, inglês, noções de direito e economia. - No conjunto das provas, procuramos avaliar muito mais a capacidade de articulação das idéias, verificar a maturidade intelectual do candidato do que fazer com que ele reproduza um conhecimento memorizado, inclusive na prova objetiva - diz o coordenador do concurso, Geraldo Tupynambá, do IRBr.
THIAGO COPETTI
O concurso
Prazo: 14 de janeiro a 14 de fevereiro
Cargo e vagas: terceiro secretário/diplomata (115)
Inscrições: pelo site www.cespe.unb.br/concursos
Taxa de inscrição: R$ 120
Informações: http://www.irbr.mre.gov.br/
Carreira: o aprovado cursará o mestrado profissionalizante em diplomacia do IRBr e começará com salário inicial de R$ 7.751,97. Ao longo da carreira, fará cursos obrigatórios de aperfeiçoamento, podendo chegar ao cargo de ministro de primeira classe (embaixador).
As dicas de quem chegou lá
Não se limite a estudar uma ou outra matéria. É preciso ser bom em tudo.
Leia muito. De prioridade à bibliografia recomendada. Em três anos, até ser aprovado em 2007, Maurício Costa leu 87 livros, alguns mais de uma vez.
Esteja preparado para muito sacrifício. A resistência psicológica é tão importante como o estudo. Para reduzir o estresse, Rita de Curtis opta por não estudar nada na véspera.
Jornais e revistas são fundamentais para conhecer atualidades.
É preciso escrever bem e sobre tudo. Leia bons livros. Para quem está em Porto Alegre, Costa recomenda a biblioteca do Centro Universitário Metodista/Ipa (Cel. Joaquim Pedro Salgado, 80), que fica aberta 24 horas, incluindo sábados, domingos e feriados. Outra dica é utilizar as bibliotecas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Quando fez as provas, Costa encontrou toda a bibliografia nas bibliotecas da universidade.
No dia 21 de janeiro, o IRBr divulgará no site http://www.irbr.mre.gov.br/ um guia de estudos com orientação para as provas.
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