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quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

O retorno da Rússia

Em um artigo passado, tratei da ascensão política e econômica da Índia, um dos candidatos a pólo de um eventual novo equilíbrio global de forças. Neste artigo, pretendo tratar de um outro candidato, mas com trajetória sensivelmente diferente daquela que marca a Índia: a Rússia.

A Rússia é, de fato, entre os Estados apontados como os futuros grandes do século XXI, o único que exerceu o papel de grande potência política e militar. De fato, pelo menos desde o início do século XIX, o Império Czarista já figurava entre as potências globais, tendo vencido, ao lado da Coligação, a França Napoleônica, e disputando com a Grã-Bretanha - a grande potência do período - a hegemonia sobre o Oriente Próximo e a Ásia Central. Declinou nas últimas décadas do século ao não conseguir acompanhar o ritmo da Revolução Industrial que se espalhava pela Europa e pela América do Norte e por se ver alijada da corrida imperialista pela África e pela Ásia. A ascensão dos Estados Unidos e do Japão contribuiu ainda mais para eclipsar a Rússia como grande potência no concerto internacional, especialmente após a derrota de São Petersburgo para as tropas japonesas na guerra de 1904-05, pela posse da Manchúria, derrota que engatilhou uma série de convulsões político-sociais que culminaria na Revolução de Outubro.
É a partir da constituição da União Soviética, em 1922, e do processo de estabilização do Estado e da sociedade após as convulsões da Revolução (ou revoluções, talvez seja mais exato) e da Guerra Civil - processo caro em termos políticos, econômicos e, especialmente, humanos - que a Rússia vai retomar sua projeção internacional. A era de Stálin e sua política marcadamente realista (realpolitik) e muito pouco - para dizer o mínimo - revolucionária ("socialismo num só país") deram ensejo à ascensão de uma potência política, econômica, militar e ideológica que foi capaz de fazer frente aos Estados Unidos. A historiografia mais recente tem questionado a dimensão do poder soviético e sua capacidade de equilibar o poderio americano, mesmo no período em que se deu o auge do Estado soviético, nos anos 60-70. Seja como for, o fato é que a URSS foi por aproximadamente quatro décadas uma das duas superpotências globais e atuou como bastião político e ideológico para "metade do planeta e quase um terço da humanidade", conforme nos recordam os sempre precisos dizeres de Hobsbawm.

O Estado soviético reinou soberano no concerto dual das superpotências até meados dos anos 80, quando sua crise já era evidente para o mundo todo. As profundas transformações por que passaram a Europa e o mundo nos anos 90 foram em grande parte causa e conseqüência da dissolução da URSS - a aceleração da globalização, a incontestabilidade do poderio militar e econômico americano da era Reagan, a falência do comunismo e a conseqüente 'primavera' dos povos do Leste Europeu, que se disseminou como parte de uma verdadeira revolução democrática global (a "terceira onda", nos dizeres de Huntington), que varreu o mundo da América Latina a Tiananmen.

A década de 90 foi caótica para a recém-reconstruída Rússia. Herdeira da URSS em vários aspectos, políticos e jurídicos principalmente, a Rússia não conseguiu manter o poderio de sua antecessora, que, na realidade, esfacelara-se antes mesmo do colapso do Estado, em 1991. Esforçando-se por ser aceita na comunidade internacional, Moscou não poupou esforços para normalizar suas relações com os Estados Unidos e com a Europa: liberalizou sua economia, numa clara aceitação dos princípios homogeneizantes do Consenso de Washington; negociou com Bielorússia e Ucrânia a transferência dos arsenais nucleares sob a posse destes países para a Rússia; endossou a Carta de Paris da OSCE, que por sua vez reafirmava os princípios da Ata de Helsinque de 1975, bem como dos direitos humanos, da democracia e da liberdade; aceitou o Acordo 4+2, que previa a reunificação da Alemanha; retirou tropas do Leste Europeu; assinou acordo de parceria com a OTAN; havia, ainda como URSS, apoiado a operação de paz contra o Iraque na Guerra do Golfo - medidas, enfim, que, entre outras tantas, tinham como objetivo o reposicionamento da Rússia na cena internacional. Os esforços, no entanto, não foram suficientes para (re)colocar o país nos trilhos: a Rússia seria sacudida por uma série de crises econômicas, que inevitavelmente respingavam para o mundo político, interno e externo. A partir de 1998, o país mergulhou numa crise finaceira que agitou os mercados de todo o mundo, um processo que foi a culminância da crise de transição pela qual passava o país. Não era fácil, afinal, desmantelar em poucos anos um sistema que por oito décadas fora controlado pelo Estado e passar o bastão para o indivíduo, o homos economicus, base de uma economia livre de mercado. Adicionalmente, no campo político a Rússia vivia as crises intermináveis do separatismo, especialmente na Chechênia, ocupada por tropas de Moscou desde 1994.

A Rússia de Ieltsin (1991-9), enfim, sacudida por crises internas, não conseguiu retomar o status internacional de que gozara a URSS por quase meio século. Numa análise retrospectiva, o caos da década de 90 parece ter começado a ceder a partir de 2000 - mais especificamente a partir de 31 de dezembro de 1999, quando Ieltsin renunciou à presidência do país em favor de seu ministro Vladimir Putin, que, presidente interino inicialmente, seria eleito para ocupar o assento presidencial no Kremlin em março de 2000.

A Rússia de Putin alcançou uma estabilidade política e econômica notável. Vários fatores contribuíram para o sucesso russo, alguns dos quais já destaquei em outro artigo ("2007 - uma retrospectiva", publicado em dezembro do ano passado): o crescimento econômico mundial acelerado; o ressurgimento do estatismo na economia do país, que foi capaz de conferir certa ordem ao caos econômico russo; a "caça aos oligopólios" promovida por Moscou; a quase ausência de oposição política organizada ao governo de Putin; a postura assertiva de Moscou na política internacional; o aumento do preço do gás e do petróleo - riquezas fundamentais para a economia russa -, entre outros fatores. O país voltou a crescer a taxas de 6-7% ao ano, e alcançou níveis de prosperidade inéditos para grande parte da população russa - alijada do livre consumo durante o período comunista e as crises dos anos 90. A estabilidade política foi alcançada- ainda que às expensas da democracia russa. Pode-se intuir, também, que o sucesso da economia russa contribua para eclipsar as demandas por mais abertura política. A Rússia é, seja como for, um país em franco crescimento econômico e politicamente estabilizado.

É aproveitando-se desse bom momento que a Rússia tem exibido um perfil extremamente assertivo nas mais variadas questões de política internacional. A recalcitrância dos anos 90 deu lugar a uma postura independente e afirmativa, que busca reinserir a Rússia no concerto das grandes potências.

Capacidade para tal, é inegável que a Rússia a tem. Economicamente, o país é o segundo maior exportador mundial de petróleo, e dispõe das maiores reservas de gás natural do planeta. Para além da riqueza que geram, nestes tempos de preços ascendentes de um e outro recurso, a Rússia os tem usado como instrumentos de poder estratégico para exercer pressão sobre a Europa. O continente é grande consumidor de hidrocarbonetos da Rússia, e todos os gasodutos e oleodutos que ligam-no ao Oriente Médio passam igualmente por território russo, o que dá a Moscou uma capacidade de controle e pressão notável, que já exerceu sobre os países europeus há alguns meses, quando ameaçou diminuir ou cessar o fornecimento de gás natural a pretexto de questões que envolviam a União Européia e países do Leste, ex-satélites soviéticos. Com um PIB de quase US$ 1 trilhão e crescimento anual nas casa dos 7%, capacidade científico-tecnológica desenvolvida, população alfabetizada, consumo interno em alta e exportações estratégicas, a Rússia conta com assets que fazem dela uma promessa econômica para o século XXI.

Política e diplomaticamente, a Rússia é membro permanente do Conselho Segurança e, desde 1997, o oitavo membro do G8. Tem a capacidade, portanto, de exercer grande influência sobre a construção da agenda internacional de segurança e, mesmo, de outros assuntos com os quais tem lidado o G8, inclusive meio ambiente. O país é partícipe ativo de todas as questões internacionais de peso - participa das negociações hexapartites com a Coréia do Norte e das negociações sobre a questão nuclear iraniana, apóia - por razões internas - os Estados Unidos em sua "guerra ao terror", foi decisivo para a entrada em vigor do Protocolo de Kyoto. Exerce ainda grande influência sobre a Ásia Central e sobre o Leste Europeu, o que tem levado o país a entrar em conflito com a União Européia e com os Estados Unidos - veja-se, por exemplo, a rejeição ao sistema antimíssil americano na Polônia e na República Tcheca ou - questão de extrema relevância no momento - o dissabor (para dizer o mínimo) com a iminência da independência de Kosovo.

Não apenas por questões externas, mas também por internas, a Rússia se tem mostrado contrária à independência da província sérvia. Externamente, Moscou teme pela perda de influência numa região historicamente estratégica, os Bálcãs, e pelo enfraquecimento ainda maior de seu antigo aliado, a Sérvia. Internamente, Moscou também teme que a independência kosovar sirva como exemplo a províncias e regiões habitadas por grupos étnicos distintos do grupo "hegemônico" - se se pode dizer assim -, o que, para um país multiétnico como a Rússia, pode significar a eclosão de uma série de movimentos separatistas do Báltico à Sibéria.

Militarmente, enfim, a Rússia conta com o disciplinadíssimo Exército da Federação Russa, criado em 1991 com o desmantelamento do Exército Vermelho, e com um setor industrial-militar que se situa entre os mais desenvolvidos do mundo. É, ademais - e mais importante - a segunda potência nuclear do planeta, com mais de 8.000 ogivas nucleares ativas e outras 12.000 "em estoque" (dados do SIPRI, Stockholm International Peace Research Institute, 2006; http://www.sipri.org/contents/expcon/Russia.pdf). Não há dúvida de que entre todos os "emergentes", a Rússia é o país militarmente mais bem-preparado e poderoso.

Hedley Bull, eminente autor da chamada Escola Inglesa das Relações Internacionais, afirma que toda potência emergente é, em sua região, já uma grande potência, e a Rússia não parece ser exceção. Ocorre, no entanto, que a Rússia e seu entorno configuram uma região historicamente disputadíssima - a "ilha mundial" e, mais especificamente, a heartland, na terminologia de Halford Mackinder. Isso significa que o ressurgimento da Rússia como grande potência global poderá causar mais atritos e conflitos do que se imagina, não apenas com a superpotência do momento, mas também com os países europeus e com as outras potências emergentes da região, especialmente a China. Como toda situação de estabelecimento de um novo equilíbrio, a emergência de novas potências poderá causar momentos de instabilidade e uma transição conturbada. A se fiar na História, pode-se apostar (na falta de um verbo mais apropriado...) que a Rússia estará no centro dos acontecimentos...

7 comentários:

Anônimo disse...

Como análise da situação atual, e de como se chegou até aqui, as análises postadas no blog estão "ok".

Contudo, estas análises acabam sendo insuficientes para prever o futuro. Tenho minhas dúvidas com relação ao futuro dos BRICs, desculpando o trocadilho...

A "estrela" China virou centro mundial de produção de quinquilharias de todo tipo. Os custos ambientais e sociais disto estão sendo omitidos, mas é questão de tempo até aflorarem. Os desertos vão se expandindo e água potável é um problema para um contingente cada vez maior de pessoas. Além disto, é um país super ou até hiperpovoado, sem recursos naturais próprios para sustentar seu povo. Portanto, é muito vulnerável, mesmo se conseguir atingir o status de "superpotência".

Similar é a situação da Índia. Só que esta especializou-se na prestação de serviços ao mundo, notadamente na área da informática, aproveitando a estrutura física e cultural legada pela Inglaterra. Mas possui problemas semelhantes de superpopulação e de esgotamento dos recursos naturais e ambientais.

A Rússia e o Brasil distinguem-se dos seus "pendants" na Ásia por serem ricos em recursos naturais e por ainda não poderem ser considerados superpovoados.

A Rússia também é um arrazoado de grupos "étnicos" que foram "realocados" e "misturados" à força na época stalinista para formar o "novo Homem soviético". Sociedades com este tipo de padrão tendem a se desintegrar quando o Estado deixa de ser ditatorial, como se viu no caso da ex-Iugoslávia. Aliás, Índia e China também possuem problemas neste sentido.

Quanto ao Brasil, este se caracteriza por possuir uma organização estatal arcaica, que atende primordialmente aos interesses daqueles grupos que se adonam do poder. É um estado que não foi capaz de organizar a migração de enormes contingentes populacionais do campo para as cidades, gerando o atual caos urbanístico, social e ambiental das grandes cidades brasileiras. É um estado que não leva em consideração variáveis como a ambiental nas políticas públicas que desenvolve (vide PAC, Amazônia, planos diretores de cidades). E isto cobrará seu preço, que será tanto mais alto quanto mais tempo se aplicar a estratégia do "empurrar com a barriga".

Portanto, e sem ter esgotado o assunto, sou da opinião de que "BRIC" é um termo que deveria ficar restrito à esfera na qual foi criado - oportunidades de investimentos em ativos "subavaliados", segundo o Goldman Sachs. Aliás, uma das características comuns a todos os "BRIC"s é a de que são países de emigração, o que demonstra que as parcelas mais "empreendedoras" de sua população vão buscar oportunidades em outros lugares.

Anônimo disse...

Caro Lagerfeld

Sua análise foi concisa e, ao mesmo tempo, penetrante. Chegou ao ponto ao nomear as grandes dificuldades que deve enfrentar cada um dos BRICs para se firmar como estrelas no firmamento global. Permita-me, no entanto, tecer alguns comentários rápidos.

Não me parece que a relativa "pobreza" da China em recursos naturais seja um empecilho a seu crescimento e desenvolvimento (que são duas coisas distintas, aliás...). Não nos esqueçamos de que países pobres em recursos naturais, como o Japão, a Bélgica e a Holanda foram pioneiros da revolução industrial, bem a frente de gigantes como a Rússia e o Brasil. Pode-se afirmar que esses países tiveram o aporte de recursos trazidos de suas colônias, por meio da manutenção da política imperalista; cabe ressalvar, no entanto, que não é preciso ser potência colonial para importar recursos naturais... O comércio internacional desempenha bem esse papel... A China tem desenvolvido uma política feroz de aproximação estratégica com países ricos em recursos naturais, a exemplo de alguns países africanos, para onde Pequim tem aportado bilhões de dólares em investimentos anuais - Angola, Sudão, Moçambique, Egito etc. Uma outra forma de compensar a relativa escassez de recursos naturais é a tecnologia - exatamente o que fez o Japão, ao se firmar como um dos maiores produtores e criadores de tecnologia nas mais diversas áreas, especialmente tecnologia avançada. Evidente, no entanto, que recursos naturais são assets fundamentais para qualquer sociedade. Mas a História prova que tê-los em abundância em seu respectivo território não é condição, por si só, para o desenvolvimento econômico.

"Superpopulação" não parece ser, tampouco, um problema. Grandes populações são grandes contingentes em potencial de trabalhadores, engenheiros, cientistas, governantes, soldados (por que não?). Não foi à toa que Morgenthau e Aron listaram o tamanho da população como recurso de poder. Por outro lado, países como o Japão também podem ser considerados superpovoados, e nem por isso deixam de ser desenvolvidos. A bem da verdade, o que importa não é tanto o tamanho da população, mas a riqueza que ela gera e as oportunidades que se lhe conferem. Haiti e Bélgica têm, ambos, densidade demográfica parecidas (Banco Mundial, 2007) - e, no entanto, seus níveis de desenvolvimento são brutalmente desiguais.

Se a China alcançar o status de potência, sua vulnerabilidade estará em sua incapacidade de incluir em seu processo de crescimento e desenvolvimento um contingente imenso de pessoas ainda à margem de seu espetacular desempenho econômico - a despeito de seu sucesso em alçar milhões de pobres a condições mais dignas de vida anualmente. Não nos esqueçamos de que a China é a principal responsável, nos últimos 20 anos, pela redução da pobreza, absoluta e percentual, no mundo em desenvolvimento... Seja como for, não me parece que "superpopulação" ou "escassez de recursos naturais" sejam problemas incontornáveis.

Quanto ao "arrazoado" étnico que é a Rússia, e que, segundo sua avaliação, poderia desmoronar quando "o Estado deixar de ser ditatorial", no meu entender a solução para Estados plurinacionais e/ou multiétnicos não é a ausência de democracia, mas exatamente seu oposto: apenas o fortalecimento de uma democracia inclusiva e de um processo de crescimento econômico, grosso modo, igualitário pode manter a estabilidade de Estados plurinacionais. Veja-se a Espanha ou o Canadá, por exemplo. Se há alguém a quem interessa ver a Catalunha ou o País Basco fora da Espanha e, por extensão, da União Européia, estes são os grupos mais radicais e, em casos, extremistas. A suas populações o que interessa é a autonomia e a manutenção de sua identidade dentro de um Estado inclusivo e democrático, próspero e livre. Problemas identitários são, claro, sempre potencialmente desestabilizadores. Mas a solução para eles é mais democracia, não menos. O que se viu nos Bálcãs foi a substituição de um regime ditatorial por um outro, igualmente não-democrático, exclusivo de um grupo nacional que pretendia subjugar todos os demais. Dizer que o que desintegrou a ex-Iugoslávia foi o desaparecimento da mão de ferro de Tito e o surgimento de uma democracia é ignorar fatos cruciais.

Tudo o que se disse do Brasil é verdade. Esquece-se, entretanto, de que este mesmo Estado conseguiu, em sete décadas, ser catapultado de uma estrutura agrário-exportadora, verdadeiramente arcaica, à condição de uma das 15 maiores economias do mundo, um dos únicos países do planeta com uma indústria diversificada, em que a presença de indústrias nacionais não pode ser desprezada. É o país que conta com centros de excelência em conhecimento e tecnologia, como a USP, que em 2006 figurou no ranking das 200 melhores universidades do mundo, uma das únicas fora do mundo desenvolvido e da China, a Embrapa, a Petrobras, líder global de pesquisa e extração de petróleo em águas profundas, a Embraer, uma das grandes companhias de aviação de jatos de pequeno porte do planeta, a Vale, uma das maiores mineradoras do mundo, entre tantas outras companhias que são, sim, sinônimos do empreendedorismo do País. Igualmente, o Brasil é o País que conseguiu vencer a luta brutal contra a inflação e a dívida externa; fez catapultar suas exportações; faz crescer seu mercado interno; fortalece suas posições de IED; tem, em suma, uma economia fortalecida e em crescimento. Deixar de ver este lado da economia do país e apenas concentrar-se em seus defeitos é uma postura que merece revisão. Não quis aqui defender uma visão ufanista e laudatória do País, mas apenas apresentar outros elementos que, ao lado dos elementos ruins que você citou, formam a paisagem verdadeiramente contrastante - para o bem e para o mal - de nossa sociedade.

Finalmente, a questão ambiental: não se pode mais restringir a questão ao âmbito nacional. Ou se enfrenta a degradação ambiental com esforços conjuntos de toda a comunidade internacional e da humanidade, ou então iremos todos sofrer as conseqüências, indistintamente.

BRIC é apenas um acrônimo criado, como você bem disse, para avaliar oportunidades de investimento. Mas é inegável que, por trás do "financismo" de sua finalidade, existem quatro países cujas economias reais são de fato fortes, estão progredindo e são potencialmente algumas das maiores do mundo nas próximas décadas. O desafio do desenvolvimento exige solucionar problemas, e eles estão aí, para todos nós; mas não se pode deixar que esses problemas eludam o potencial e as qualidades de que dispõem essas e outras economias. E esse potencial é imenso...

Anônimo disse...

Muito interessantes as análises.
Quanto a China, concordo com Lagerfeld. Diferentemente do passado, cquanto Bélgica, Japão e outros se desenvolveram, hoje superpopulação é sim um problema - e grande. Tanto que as populações dos países desenvolvidos estão estáveis (exceto EUA) e a China tem o maior plano de controle populacional atual. Além disso, ver superpopulação como fonte de poder é uma visão muito restrita, somente do ponto de vista econômico. Se analisarmos a ecologia de populações, proposta por Odum, vemos que toda a população (de seres vivos) chega a um limite, chamado capacidade de suporte. E estamos chegando - se já não chegamos - a este limite. Além o padrão de consumo atual é muito maior, tanto que, se todo habitante consumisse o padrão de uma amerciando da classe média precisaríamos de três Terras. Além disso, devemos pensar em termos de desenvolvimento sustentável, incluindo tanto as variáveis sociais quanto ambientais, e, nesse caso, a China está ainda muito longe. Acredito que a China passa por uma bolha, que breve explodirá e passará por uma crise, que exigirá novos rumos.
Não conheço a realidade da India. Acredito mais no potencial de Rússia e Brasil. O primeiro pela tradição em diversas áreas (tecnológica, militar, etc.)
Já quanto ao Brasil, temos um diferencial quanto aos demais, recursos naturais em relativa abundância. Vivemos num momento de escassez desses recursos, diferente de outros tempos (o que reforça minha posição quanto a China). Esses recursos nos possiblitam matrizes energéticas alternativas aos combustíveis fósseis, cada vez mais raros e caros. Assim, podemos ter hidrelétricas e usinas eólicas e solares para a geração; álcool e biodiesel para o transporte; além de gerar produtos agregrados em outras atividades ligadas a biodiversidade. Claro, precisamos de inúmeras reformas, mas todas elas basicamente internas. Dependemos só de nós mesmos para nos tornarmos um das grandes potências emergentes dos próximos anos.

Unknown disse...

Nossa, que texto maravilhoso, foi gostoso de ler e fácil de compreender.
Parabéns Fábio.
Cada dia que passa sinto mais orgulho de você.

Anônimo disse...

Sem desconhecer a realidade da crise ambiental e a possibilidade de esgotamento de recursos naturais, a política de controle populacional chinesa, a explosão demográfica, e tantos outros fatores explícita ou implicitamente citados nas comentários de lagerfeld e "anônimo", toda análise que aponta para o problema da superpopulação me traz à mente as idéias malthusianas e suas derivadas, como aquelas sobre o "crescimento zero", propagandeadas pelo Clube de Roma nos anos 60 e 70.

Correndo o risco de fiar-se em demasia na idéia de progresso humano, é fato inegável e incontestável que a história da humanidade é marcada por um contínuo avanço tecnológico - maior para algumas sociedades, menor para as outras, mas sempre constante. Dessa vez será diferente? Bom, poder-se-ia dizer que sim, já que pela primeira vez confrontamos a possibilidade real de autodestruição humana por fatores naturais. Mas o que dizer da capacidade criadora do ser humano? É idealista demais pensar no desenvolvimento de novas tecnologias que venham a reduzir o dano ambiental - já causado, isso é certo -, bem como frear o consumo de recursos naturais? Na atualidade, se utilizam menos recursos para a produção de uma gama imensa de produtos que, há quatro, cinco, seis décadas, consumiam quantidades imensas dos mesmos recursos. Graças a quê? À tecnologia. Há décadas, era impensável mover um automóvel à base de combustível não-fóssil - hoje isso é realidade, para ficar num exemplo apenas. Fiar-se na tecnologia não me parece utopia...

Meu argumento é de que a superpopulação não é, em si, o problema. Nem tampouco o é a capacidade de criação de riqueza e de bem-estar (com a devida licença para usar um conceito tão utilitarista de bem-estar...). O problema é o inverso, a NÃO criação de riqueza ou sua péssima, terrível distribuição. Este é o ponto. Tente dizer a um camponês chinês que o problema é ele existir...

Em segundo lugar, é falacioso imaginar que apenas atividades de geração de riqueza causam impacto ambiental. A pobreza é um dos grandes estímulos à degradação ambiental: péssimo cultivo agrícola (geralmente de modo extensivo, com subaproveitamento do solo e sua degradação), ocupações irregulares de áreas ambientalmente sensíveis (margens de rios, lagos, encostas, regiões de mata etc.), falta de saneamento básico e conseqüente poluição do solo e da água, parco desenvolvimento de tecnologias limpas, baixos níveis de educação e conseqüente desinformação sobre temas ambientais, entre outros, são fatores que, andando de mãos dadas com a pobreza, causam profundo impacto no meio ambiente. Não é à toa que países ricos como o Reino Unido (que conseguiu despoluir o Tâmisa) e os países nórdicos (que recuperaram de modo espetacular boa parte de sua cobertura vegetal por meio de programas de reflorestamento) são grandes exemplos de tratamento da questão ambiental - que não se resume apenas à mudança climática, importante como seja. A proteção ambiental exige, sim, recursos e informações, por mais que se queira negar, que geralmente estão associadas à criação de riquezas...

Que o planeta e seus recursos são finitos, isso é fato, científica e intuitivamente comprovado. E que sua população tem um limite numérico aceitável, também é fato. Mas o problema - e eu insisto - não é a superpopulação em país X ou Y. O problema é a forma como temos gerado e mantido padrões de distribuição de riqueza que são profundamente iníquos. Precisamos rever esses padrões. Difícil é convencer um chinês que, agora que chegou sua vez, ele não poderá consumir como um americano... Tarefa das mais ingratas, com certeza. Mas que fique claro: em minha opinião, o problema não é o chinês...

Anônimo disse...

CAro Fábio
De fato, o problema não é um chinês, mas políticas antigas da China, tanto que ela própria está promovendo o controle de natalidade. E como disseste, é pior temos 2 bilhões de pobres do que 500 milhões de pessoas com uma qualidade de bem-estar razoável. O problema são os extremos. EUA também é um problema e grande. E seu consumismo é um dos maiores problemas do mundo. O ideal é uma distribuição dos recuros (inclusive tecnológicos) que proporcione um razoável bem-estar ao maior número de pessoas, sem exageros de consumo.

DEEP disse...

Olá!
Realizei hj a prova do CACD e, também hj - pelo transobradamento do conhecimento à saída da primeira etapa da prova - tomei conhecimento da existência deste blog.

Li os 2 últimos posts e os comentários referentes ao derradeiro.

Pois bem, gostaria então de, primeiro, parabenizar a iniciativa, a qualidade e a clareza dos textos.

Em segundo lugar, gostaria de comentar a inclusão de 2 temas que julgo, são relevantes, e convidá-los à reflexão no intuito de definir se tais acontecimentos podem, ou não, ser considerados tendências para as próximas provas.

Na prova de protuguês, chamou atenção o uso do texto do moçambicano Mia Couto, com características de seu uso local e próprio do idioma. As questões rumaram no sentido de análise comparativa das estruturas gramaticais empregadas lá e cá.

Seria essa uma tendência, digo, incluir elementos e textos de lusófonos de outros países q não o Brasil? Já ocorreu antes?

A outra ocorrência refere-se ao conteúdo do texto da prova de inglês - retirado do The Guardian Weekly de 4/1/2008 - que discorria sobre os chamados SWF´s (Sovereign Wealth Funds).

Na análise que li no último post do blog, comentando sobre a Rússia, sua importância e perspectivas, chamou-me a atenção, em especial, aquilo que o autor denominou: uso dos instrumentos de poder estratégico.

O texto do Guardian dava conta do uso estratégico de tais fundos - pela China mais explícitamente, mas tb pela Rússia - para compras de ativos de empresas do setor privado - mencionando Stanley Morgan e Blackstone.

Uma vez mais convido-os a imaginar se tal ocorrência é passageira ou merece maior relevância e estudo.

Aproveito também pra chamar atenção para os tais fundos SWF como mais um desses - igualmente efetivos conquanto mais sutis e portanto, mais preocupantes - intrumentos de poder estratégico, considerando q o texto da reportagem alerta que a existência e as "peripécias" desses instrumentos têm se mantido - ainda agora - restritos aos estudiosos e profissionais diretamente ligados à economia. O texto chega a fazer troça afirmando que ainda, numa pesquisa simples do Google, o termo traz uma enxurrada de páginas sobre softwares de design gráfico...